Verba curta prejudica até as melhores escolas do país
Saem construções e contratações, entram congelamentos e greves
Até 2013, as universidades brasileiras falavam em construir e contratar. Em 2015, os termos desapareceram do ensino superior e foram substituídos por corte e greves.
O desaquecimento da economia fez com que as melhores universidades do país segundo RUF recebessem menos recursos do que o esperado. Por serem públicas, elas dependem do repasse dos Estados ou da União.
Nas escolas paulistas (USP, Unesp e Unicamp), a verba transferida pelo governo estadual ficou 10% menor do que o previsto (até junho).
Contratações de professores estão suspensas e há corte na verba para manutenção.
Na USP, um plano de demissão voluntária de técnicos no começo deste ano levou a redução de cerca de 5% na folha de pagamento.
Nas instituições federais, decreto presidencial de junho congelou 10% da verba de manutenção e 47% da de investimento (construções e modernizações da estrutura).
As federais de Minas e do Rio tiveram dificuldades até de pagar a conta de luz.
Greve iniciada há três meses atinge as 41 universidades federais que responderam à reportagem (em algumas, docentes estão parados; em outras, técnicos). Em 17 escolas, o primeiro semestre letivo ainda não acabou.
Há reivindicação de reajuste salarial, via revisão da carreira, mas também por melhoria nas condição de trabalho.
QUAL O EFEITO?
Dirigentes universitários e pesquisadores entrevistados pela Folha dizem que a situação orçamentária atrapalha a vida das instituições no curto prazo, mas ainda não têm potencial para causar queda na qualidade do ensino e da pesquisa no médio prazo.
Essa queda só ocorrerá se as restrições se prolongarem por alguns anos, afirmam.
"Recursos humanos são a base para qualquer ambiente de ensino e pesquisa. E nosso pessoal segue bem qualificado, com doutorado", diz o secretário-executivo da Andifes (entidade que representa os reitores das federais), Gustavo Balduíno.
Ex-presidente do CNPq (órgão federal de fomento à pesquisa), Glaucius Oliva lembra que, antes do corte orçamentário, as universidades viveram fase de compra de equipamentos e reforma de laboratórios. "Precisamos nos adaptar e otimizar esses recursos nos próximos anos."
O reitor da USP, Marco Antonio Zago, afirma que as medidas de contenção de despesas foram escolhidas "para não comprometerem as atividades-fim da universidade".
Os cortes na escola começaram ano passado, antes das demais, devido ao crescimento do gasto com folha de pagamento. À época, chegou a consumir 106% do que a escola recebe do governo.
"Tomamos medidas que tomaríamos em casa", afirmou a vice-reitora da Unesp, Marilza Vieira Cunha Rudge. "Estamos apagando a luz, reduzindo o uso de água. No prédio da reitoria, colocamos borrachinha nas torneiras [para economizar água]."
Para a representante da Unesp, "é no momento de crise que as pessoas têm mais ideias interessantes".
Ela cita como exemplo a diminuição de gastos com viagens. Videoconferências passaram as ser usadas em reuniões e até em bancas de doutorados. (SABINE RIGHETTI, FÁBIO TAKAHASHI, CLÁUDIO GOLDBERG RABIN E WALTER PORTO)
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EXEMPLOS DA CRISE
UFRJ
Universidade Federal do Rio de JaneiroParalisação durou três meses, teve participação de alunos e terminou em agosto. O 1º semestre não acabou em alguns cursos
UFERSA
Universidade Federal Rural do SemiáridoGreve teve início em maio e atinge 100% dos cursos de graduação. As aulas do 1º semestre ainda não foram concluídas
USP
Universidade de São PauloPrograma de demissão voluntária para técnicos cortou 1.400 funcionários no começo deste ano; grandes obras estão suspensas
UFSC
Universidade Federal de Santa CatarinaFuncionários parados desde junho. Aulas foram mantidas, mas biblioteca e restaurante universitário estão prejudicados
UFG
Universidade Federal de GoiásGreve começou com paralisação dos funcionários, em maio; docentes aderiram ao movimento em agosto