Cuba entra em campo
Futebol já rivaliza com beisebol como esporte favorito dos jovens cubanos; resta saber se a reaproximação com os EUA irá acelerar essa popularização
Ronald Hernandez Vega dá pouca atenção a um esporte jogado com as mãos.
É segunda-feira, dia de jogo de beisebol pela liga nacional de Cuba. Hernandez Vega, 16, não se importa. Ele não veste a camisa de Yasiel Puig --o grande jogador cubano de beisebol, que atua pelos Los Angeles Dodgers, nos EUA--, mas de Messi.
O beisebol é o esporte da revolução de Cuba, mas o futebol é o esporte do mundo que está chegando.
"É um esporte forte, com movimento, energia", diz o jovem, explicando sua preferência pelo futebol.
O beisebol parece adequado a essa ilha retrô, onde as atitudes desportivas, como muitos dos carros, são da década de 1950. Mas o beisebol é estático enquanto o futebol é freneticamente criativo.
Pois o futebol agora rivaliza com o beisebol como o esporte favorito de muitos jovens cubanos. Eles jogam em campos irregulares e ruas esburacadas, improvisando com gols feitos de redes de pesca, camas e mesas.
Em um jogo da última segunda (dia 22) em Havana, jogando com os pés descalços no asfalto inclinado, Marlon Peres Capotes, 11, gritou "goooool" e deu uma cambalhota ao chutar uma bola flácida de basquete.
Agora vem a retomada das relações diplomáticas entre EUA e Cuba. Será que os norte-americanos vão ajudar a abrir o futebol cubano como eles esperam a abertura do beisebol cubano? Será entusiasmo juvenil acreditar em tal realização?
Haverá mais acesso à Major League Soccer (MLS), dos EUA, ou às ligas da Espanha ou Brasil? Será que o movimento levará Cuba a uma Copa do Mundo pela primeira vez desde 1938?
"O maior problema é não termos chance de competir internacionalmente", diz Ariel Curbalo Lopez, 45, que treina os jogadores de 16 a 18 anos na província de Mayabeque. "Nosso desenvolvimento é local. Os EUA são o país mais próximo, mas não temos sido capazes de tirar proveito da ascensão deles."
Lopez faz uma previsão ousada. "Dois ou três anos é tudo o que vai levar para o futebol se tornar o esporte mais importante em Cuba", afirma. "Em todas as ruas, as crianças estão brincando."
Há quem discorde, como Roel Santos, 26, jogador do Granma Alazanes, do campeonato cubano, e um recém-chegado à equipe nacional.
"No beisebol é mais difícil criar momentos de ação", disse Santos. Na avaliação dele, o povo cubano aprecia esse tipo de dificuldade.
MISTÉRIO
Sete cubanos jogam futebol na MLS, mas o campeonato não tem planos de contar com uma equipe em Havana, agora ou no futuro próximo, disse Don Garber, representante da MLS. As prioridades são EUA e Canadá.
"Cuba é realmente um grande mistério para o mundo do futebol", disse Garber. "Nós ainda não somos capazes de avaliar o desenvolvimento de seus jovens."
Até mesmo o vocabulário do futebol não é fácil para os cubanos. O taxista Gerardo Verdecia Acosta, 50, aprecia o esporte, mas não consegue dizer, de bate-pronto, o nome do seu jogador favorito. "O cara da Argentina eu gosto", disse Acosta. "Messi?", pergunto. "Messi!"
Seu filho tem outro favorito, conta. "Diga-me alguém do Brasil", pediu. "Neymar?", indago. "Sim, Neymar!".
É evidente, porém, que a popularidade do futebol no país cresceu nos últimos cinco ou seis anos. O esporte não se restringe mais às ruas. Já há equipes organizadas.
A Copa do Mundo de 2010, na África do Sul, foi mostrada nas TVs do país, assim como a de 2014, no Brasil. Também são transmitidos os campeonatos da Espanha, Brasil, Inglaterra, Alemanha e Itália.
A camisa de Messi, do Barcelona, e de Cristiano Ronaldo, do Real Madrid, são muito populares em Cuba.
DESAFIO
"Esse é o meu sonho, jogar na Copa contra a Argentina ou o Brasil", diz Marlon Garcia Medaro, 14, ao chutar uma bola na avenida dos Presidentes, em Havana. Esse é o desafio para os cubanos: não apenas se vestir como grandes atletas do mundo, mas desenvolver alguns dos seus próprios jogadores.
"Não há nenhuma razão para que em um país de 11 milhões de pessoas que teve reputação para produzir atletas de classe mundial não possa ser um produtor de jogadores de futebol de classe mundial", disse Garber.