Desmanche azul
Incapaz de resistir às propostas financeiras de países como China e Emirados Árabes, o bicampeão Cruzeiro dá adeus a alguns dos seus principais atletas
O torcedor que for a Governador Valadares no domingo (1º) acompanhar a estreia do Cruzeiro no Campeonato Mineiro pouco verá do time que conquistou o segundo Brasileiro seguido há dois meses.
Cinco dos 11 titulares da partida que lhe garantiu o título, a vitória por 2 a 1 sobre o Goiás, em 23 de novembro, já deixaram a equipe.
E pior: não foram quaisquer titulares. O desmanche atingiu alguns dos principais nomes do time dirigido pelo técnico Marcelo Oliveira.
Não perca a conta: o volante Lucas Silva, a revelação do ano passado, assinou contrato com o Real Madrid. O meia-atacante Ricardo Goulart, vencedor da Bola de Ouro da revista "Placar" de 2014, mudou-se para o chinês Guangzhou Evergrande.
O lateral esquerdo Egídio agora atua no Dnipro, da Ucrânia. Marcelo Moreno, autor de 15 gols no Brasileiro, teve empréstimo encerrado e foi devolvido para o Grêmio.
O último a sair foi o meia Everton Ribeiro. Eleito o craque do Brasileiro nos dois últimos anos, o meia acertou a transferência para o Al Ahli, dos Emirados Árabes Unidos.
O Cruzeiro teve de lidar com o desmanche até mesmo longe dos gramados. O diretor de futebol Alexandre Mattos, responsável pela montagem do elenco que se sagrou bicampeão nacional, foi contratado pelo Palmeiras.
"Nunca foi nossa intenção vender nenhum jogador, mas os três [Ricardo Goulart, Lucas Silva e Everton Ribeiro] receberam propostas financeiras muito boas e pediram para serem liberados", disse o diretor de comunicação do clube, Guilherme Mendes.
De acordo com o dirigente, eles cumpriram seus ciclos. Chegaram ao clube pouco conhecidos, tornaram-se jogadores de seleção (olímpica, no caso do volante), valorizaram-se e provocaram interesse de times estrangeiros.
Mendes também diz que o Cruzeiro precisou negociar os jogadores para atender aos parceiros (fundos de investimento ou empresários) que gastaram nos anos anteriores para permitir a chegada desses atletas e agora viram o momento mais propício para recuperar o investimento.
O clube não tinha nenhuma parte dos direitos econômicos de Egídio e foi usado como "vitrine" pelo estafe do jogador para uma futura negociação para o exterior.
Nos outros casos, a participação cruzeirense girava entre 50% e 60% do total.
"Você pode chegar com 100 milhões que o Bayern de Munique não vai vender o Robben nem o Ribéry porque não precisa de dinheiro. A saída do Ricardo foi consenso", afirmou o empresário de Goulart, Sandro Becker.
O fato é que a receita do Cruzeiro para conquistar dois Brasileiros passou por gastar mais do que arrecadar. A dívida do clube saltou de R$ 120 milhões no fim de 2011 para a casa dos R$ 200 milhões.
Com o caixa no vermelho, tornou-se inviável competir com propostas salariais do exterior, mesmo elas vindo de países sem tanta tradição no futebol --com exceção de Lucas Silva, que agora irá defender o atual campeão europeu.
O desmanche deve aliviar as contas cruzeirenses. As vendas devem render ao clube em torno de R$ 85 milhões.
ALÉM DO CRUZEIRO
"O futebol brasileiro precisa vender jogadores para viver. As despesas são muito altas. O Cruzeiro ainda conseguiu manter o elenco depois do primeiro título. Agora, não deu", disse o ex-goleiro e ídolo do time, Raul Plassmann.
A situação não é exclusividade do Cruzeiro. Seu maior rival, o Atlético-MG, também não teve condições de segurar o astro da equipe, o atacante Diego Tardelli, negociado com o Shandong Luneng.
O mercado chinês absorveu ainda outro destaque do Campeonato Brasileiro, o meia argentino Conca, que trocou o Fluminense pelo dinheiro do Shanghai SIPG.