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Deus e dinos
Padre que é paleontólogo conta como concilia crença em Deus com o estudo de pegadas de dinossauros; veja teorias da origem da vida
Muitos paleontólogos (especialistas em estudar seres vivos do passado, como dinossauros e mamutes) sonham em encontrar um enorme esqueleto de bicho extinto algum dia. O padre Giuseppe Leonardi, porém, diz que simples pegadas de dinos podem ser mais interessantes do que qualquer osso gigante.
"Quando você vê uma pegada, você está vendo o animal vivo, em ação, em movimento, mesmo depois de milhões de anos", contou ele à "Folhinha" durante uma visita recente à UFSCar (Universidade Federal de São Carlos). "Dá para saber se ele estava caminhando ou correndo, se fez uma curva, se estava sozinho ou acompanhado."
Além de sacerdote da Igreja Católica (ele pertence a uma organização de religiosos chamada Congregação das Escolas de Caridade), Leonardi também é paleontólogo e diz que a vocação para virar cientista surgiu antes do plano de ser padre.
Nascido em Veneza, na Itália, em 1939, ele viveu no Brasil de 1974 a 1989 e hoje trabalha em Kinshasa, na República Democrática do Congo, na África, numa escola para crianças carentes.
PADRE CIENTISTA?
Os anos que ele passou no Brasil o ajudaram a virar um dos maiores especialistas do mundo em pegadas de animais extintos.
Leonardi estudou, por exemplo, marcas deixadas por grandes dinos e pequenos mamíferos ("primos" distantes dos nossos ancestrais) no deserto que cobria Araraquara, no interior de São Paulo, há 140 milhões de anos. "Ah, que coisa linda", diz ele, como se falasse com um bebê, ao ver uma dessas pegadas guardadas num laboratório da UFSCar.
Apesar da distância, ele continua ajudando cientistas brasileiros a estudar pegadas daqui. Uma de suas descobertas mais recentes, feitas com colegas do Rio de Janeiro, é que seres microscópicos (bactérias que vivem em poças d'água), ajudaram a preservar pegadas no Nordeste.
Não é estranho que um padre resolva estudar bichos pré-históricos? Na verdade, nem tanto, até porque padres cientistas são relativamente comuns, e a Igreja Católica aceita a teoria da evolução.
"Acho mais bonito um Deus que cria a vida através da evolução do que um que criou tudo de uma vez", explica. "Não se pode ler o Gênesis [o livro da Bíblia que conta histórias como as de Adão e Eva e da arca de Noé] como se tivesse sido escrito ontem, como histórias comuns. É preciso interpretá-lo de outro jeito", afirma.
O padre fica sério quando perguntam se ele fala sobre ciência com as crianças do Congo. "Fica em segundo plano. Na situação em que vivem, é de carinho que elas precisam", conta.