Crítica - Drama
Dupla exagera na 'coitadice' no filme 'Dois Dias, Uma Noite'
Os filmes dos irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne sempre tiveram um certo caráter religioso. Não se trata, evidentemente, de uma abordagem direta da religião, mas de um modo de ver o mundo que inclui, no arco dramático do filme, a busca pela graça e pela compaixão --uma influência evidente do cinema feito pelo italiano Roberto Rossellini (1906-1977) e de certos filmes neorrealistas.
Nunca esse caráter religioso esteve tão explícito quanto em "Dois Dias, Uma Noite", em que a protagonista Sandra, vivida por Marion Cotillard, precisa fazer uma peregrinação entre seus colegas de trabalho para tentar manter seu emprego.
A permanência de Sandra no trabalho será decidida em uma votação, na qual seus colegas são submetidos a uma espécie de "escolha de Sofia" imposta pelo próprio sistema: se eles quiserem manter um pequeno, mas significativo, bônus salarial, precisam votar pela demissão da colega, que estava afastada do serviço.
DESGASTE
Com a ajuda do marido, Manu (Fabrizio Rigone), Sandra bate de porta em porta, suplicando por votos a seu favor. Em cada parada, seu pedido coloca à prova o espírito cristão de seus colegas. As reações variam, das mais violentas às mais solidárias.
"Dois Dias, Uma Noite" demonstra sinais de esgotamento de uma fórmula adotada pelos irmãos Dardenne, ao tratar agora a personagem com condescendência e excesso de "vitimização".
Ainda assim, eles não brincam em serviço, alcançando alguns momentos de fato comoventes ao longo da peregrinação de Sandra.
Em todos eles, a graça se deve mais aos atores que fazem seus colegas de trabalho (pequenas participações, portanto) e menos a Marion Cotillard, que apesar de aparecer despida de qualquer glamour e de se esforçar bastante para abraçar o papel, acaba carregando demais no tom choroso de sua personagem.