Hollywood não fala sobre gays, diz diretor
'O Amor É Estranho', de Ira Sachs, conta história de casal de homens que se casa no papel após décadas juntos
Nos EUA, filme sem cenas de sexo recebeu classificação indicativa de 17 anos e gerou uma polêmica sobre censura
Pela primeira vez na vida, o cineasta americano Ira Sachs, 49, sentiu que o amor era possível. Foi essa nova sensação, conta, que o motivou a escrever "O Amor É Estranho". "Queria fazer um filme que aceitasse o fato de que o amor possa crescer com o tempo. Meus trabalhos anteriores eram sobre a natureza destrutiva do amor", diz.
No longa, Alfred Molina e John Lithgow vivem um casal que, após quatro décadas juntos, casa-se no papel. A união faz com que Molina seja demitido da escola católica em que trabalha, obrigando-os a vender seu apartamento e a morarem separados, de favor.
"A ideia de fazer um filme sobre pessoas mais velhas, que têm um relacionamento bem-sucedido e amoroso era muito excitante para nós", diz o brasileiro Mauricio Zacharias, corroteirista do filme ao lado de Sachs. "Porque você nunca vê isso nas telas."
Pelo Skype, do apartamento de Zacharias em Nova York, Sachs conta que gosta de fazer filmes "fora do sistema", pelos quais Hollywood não se interessa em fazer.
"Não há muito espaço para filmes pessoais e dramáticos no cinema americano. Gosto de contar histórias quietas, que mostrem momentos de fragilidade entre as pessoas", diz. "E escrevo filmes sobre gays, o que Hollywood não está fazendo."
Nos Estados Unidos, o filme, sem cenas de sexo, recebeu a classificação indicativa R, que só permite a entrada de menores de 17 anos no cinema com os pais. Os jornais criticaram: "O amor é estranho, mas violência e tortura não têm problema", escreveu o britânico "The Guardian".
"A razão que eles nos deram foi a linguagem. Tinha muito 'filho da puta'. Mas 'Um Santo Vizinho', que tem muito mais palavrões que o nosso, e sexo, recebeu uma classificação mais baixa que a gente", afirma Sachs.
"Foi uma forma de censura. Percebi que é um órgão [que determina a classificação indicativa] conservador e homofóbico", diz. "Isso me deprimiu. É verdadeiramente um filme para a família."
"Mostramos o filme para amigos que têm filhos e que gostaram muito. Adolescentes de 14, 15 anos de idade. Até 12 e 13", diz Zacharias.
"Descobrimos depois que havia professores que pretendiam levar seus alunos para assistir e isso não seria mais possível. É sim um tipo de censura", completa.
Embora fale do preconceito que ainda existe em relação ao casamento gay, das dificuldades encontradas por pessoas na terceira idade e do preço altíssimo dos imóveis em Nova York atualmente, por exemplo, o filme não é exatamente político, e sim uma grande história de amor.
"Foi uma decisão fazer um filme sobre relacionamentos, família e intimidade. Mas tentamos ser precisos em relação ao tempo em que vivemos. As questões sociais são uma moldura dramática para a história", diz Sachs.