'A memória de meu país estava se perdendo', diz Thiong'o
Em sabatina promovida pela Folha, escritor queniano explicou por que abandonou o inglês em seus livros
"Como escritor e ativista, acredito na imaginação, no sonho, em libertar o possível do impossível", defendeu o queniano Ngugi wa Thiong'o, 77, nesta terça (7), em encontro promovido pela Folha, parte de uma série de eventos com autores que participaram da Flip (Festa Literária Internacional de Paraty).
O escritor conversou com a colunista da Folha Raquel Cozer e as jornalistas Úrsula Passos e Angela Boldrini.
Ano após ano, ele lidera a lista de apostas ao prêmio Nobel de Literatura. Apesar disso, era praticamente desconhecido no Brasil.
Passou a ser publicado no país apenas recentemente --saíram neste ano "Um Grão de Trigo" (1967, editora Alfaguara) e "Sonhos em Tempo de Guerra" (2010, Biblioteca Azul), primeira parte de uma trilogia ainda não finalizada de memórias. Os dois possuem como pano de fundo a luta pela independência queniana.
"Entre 1895 e 1963, fomos colonizados pelos ingleses. Eu nasci em 1938, nas vésperas da Segunda Guerra", contou ele. "Cresci vendo os prisioneiros italianos. E depois veio a luta pela libertação, que começou em torno de 1952."
"Esse é o pano de fundo por trás das histórias desses dois livros. Eu quis preservar essa memória de lutas para que meus filhos e netos pudessem conhecer."
Thiong'o escreveu seus primeiros livros em inglês. Começou a criar em um dos idiomas locais, o gikuyu, em 1977, quando foi trabalhar em uma comunidade queniana como professor.
"O colonialismo tenta impor seu idioma sobre as pessoas. Eu notei que esta memória do meu país estava se perdendo. Todo mundo tem o direito de se expressar no idioma materno."
Durante sua apresentação na Flip, Thiong'o disse que era preciso ter consciência do papel desempenhado pelos negros na criação da Paraty.
"Quando passo por Paraty, por São Paulo, a primeira coisa que quero ver é como os negros vivem no Brasil. Será que eles são visíveis?"