Entrevista José Padilha
Pablo Escobar não era nada ambíguo, era um facínora
EM SÉRIE SOBRE O TRAFICANTE COLOMBIANO, DIRETOR DE 'TROPA DE ELITE' CRITICA GUERRA ÀS DROGAS EMPREENDIDA PELOS EUA
Se até mesmo o truculento capitão Nascimento, de "Tropa de Elite", guardava alguma ambiguidade, o Pablo Escobar retratado na série "Narcos" não deixará dúvidas: será um facínora inequívoco.
Palavra do cineasta carioca José Padilha, 48, diretor de "Tropa...", que volta a escalar Wagner Moura, agora no papel do megatraficante colombiano morto em 1993.
Com dez episódios na primeira temporada, o seriado "Narcos" chegará ao serviço de vídeos sob demanda Netflix no dia 28. Produtor-executivo da série e diretor dos dois primeiros capítulos, Padilha falou por telefone e e-mail com a Folha, de Los Angeles, cidade para onde se mudou após sofrer, segundo relata, uma tentativa de invasão de sua produtora no Rio.
Folha –Por que adotar o ponto de vista da DEA, a agência antidrogas americana, na série?
José Padilha – Esse enfoque acrescenta um componente à narrativa: além da história do surgimento dos cartéis, podemos mostrar a forma pela qual os EUA interferiram na Colômbia e na luta contra o narcotráfico local. [O ex-presidente Ronald] Reagan tentou resolver o problema pelo lado da oferta, e não pelo lado da demanda. Isso explica por que a oferta das drogas migra de país em país. A demanda? Continua igual. Vista dessa forma, a questão das drogas vira um problema de polícia, e não de saúde pública.
Pretende embutir esse tipo de discussão na série?
Sim, mostrando como as pessoas que fazem parte desse aparato ficam tão imersas nele que não conseguem nem ver o absurdo que é. Teve um momento em que o objetivo dos EUA era pegar Pablo Escobar mesmo quando ele não tinha mais importância, e o cartel de Cáli, por exemplo, é que estivesse em alta abastecendo os EUA com drogas.
Isso teve duas consequências: a fronteira da droga migrou e causou superlotação nas cadeias. Está provado pela história que deu errado.
Em partes de Medellín, Escobar é tido como o herói que construiu hospitais quando o Estado não fez. Pretende abordar essa ambiguidade?
Ele não é ambíguo, a não ser para quem tivesse algum interesse em receber algo dele. É o mesmo que ocorre com certos traficantes do Rio. Não resta a menor dúvida de que Escobar é um facínora, um psicopata capaz de derrubar avião e matar 200 pessoas.