Governo aumenta dívida pública para financiar empresas
Recursos do Tesouro Nacional aplicados no BNDES foram de R$ 10 bilhões para R$ 450 bilhões desde 2008
Economistas criticam critério para escolher quem recebe, o que cria "orçamento paralelo" sem aval do Congresso
As empresas brasileiras estão cada vez mais dependentes de linhas de crédito com juros subsidiados, aquelas com dinheiro público e controladas pelo governo.
Estudo do Banco Central mostra que a participação dos empréstimos com juros controlados no endividamento das companhias que atuam no país passou de 25% para 30% do total entre junho de 2008 e junho de 2014.
Já o crédito concedido livremente pelos bancos, a taxas de mercado, caiu de 43% para 31% do total. Mantida a tendência, o crédito subsidiado deve se tornar a principal fonte para o setor produtivo.
O aumento do crédito subsidiado tem sido um dos principais temas da campanha eleitoral deste ano, com Dilma Rousseff (PT) defendendo a manutenção da política atual e Aécio Neves (PSDB) afirmando a necessidade de reduzir essa dependência.
Mais de 70% do crédito subsidiado sai do BNDES (banco estatal de desenvolvimento), que empresta, sobretudo, recursos do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) e do Tesouro Nacional. Hoje o Tesouro tem R$ 450 bilhões colocados no BNDES.
Para injetar esse dinheiro, o governo teve de aumentar a dívida pública. Os R$ 450 bilhões correspondem a 15% da dívida bruta do setor público. Antes de 2008, o valor era inferior a R$ 10 bilhões.
O dinheiro é obtido pelo governo no mercado, com base na taxa básica de juros, que está hoje em 11% ao ano. Os empréstimos concedidos pelo BNDES têm como referência a TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo), de 5% ao ano. A diferença é bancada com recursos do Tesouro.
Para as empresas, a taxa média de juros do crédito livre está em 23% ao ano, segundo dados mais recentes do BC. Nas operações com subsídios, é de 8% ao ano.
PREFERÊNCIAS
Além do custo, economistas criticam o fato de o dinheiro ser emprestado de acordo com preferências do governo, criando uma espécie de orçamento paralelo, que não precisa passar pelo Congresso.
Os números do BNDES mostram que grandes empresas ficaram com 61% dos recursos liberados em 2013. Apesar do recuo em relação a 2010 (70%), a concentração ainda é considerada elevada.
"Isso cria uma distorção. É um dinheiro subsidiado do trabalhador e do Tesouro", diz Eduardo Luzio, professor da FEA (Faculdade de Economia e Administração) da USP.
As grandes companhias têm acesso a outras formas de financiamento, como o mercado de capitais (ações e títulos de dívida, por exemplo). Essa opção, no entanto, segue na "lanterna" entre as principais fontes das empresas, tendo crescido de 8% para 10% entre 2008 e 2014.
Houve um aumento nesse período de empréstimos obtidos no exterior, por meio de bancos, matrizes ou filiais em outros países, que passaram de 24% para 29% do total.
Ricardo José Stefani, professor do Ibmec/DF, afirma ser importante destinar recursos subsidiados a empresas de menor porte e a negócios de interesse do governo, como obras que não dariam lucro ao setor privado se fossem financiadas a juros maiores.