'Brasil deixou pré-sal pouco competitivo'
Exigência de conteúdo local e mudança de regras encareceram petróleo brasileiro, afirma consultor americano
Para David Goldwyn, que negociou petróleo sob Hillary Clinton, Petrobras está pouco eficaz sobrecarregada
A Petrobras deixou o pré-sal "pouco competitivo" e está "sobrecarregada" de atribuições, diz o consultor em energia David Goldwyn, que foi o enviado especial do Departamento de Estado americano para negociações sobre energia durante a gestão de Hillary Clinton (2009-11).
México e noroeste da África, que também descobriram reservas nos últimos anos, usam modelos mais competitivos, diz.
Para Goldwyn, que dirige o Grupo Consultor em Energia do centro de estudos Atlantic Council, o preço do petróleo continuará a cair, mesmo com tensão no Oriente Médio, por causa da demanda estagnada e do salto na produção nos EUA. Ele recebeu a Folha em seu escritório, em Washington.
Folha - A Petrobras perdeu valor de mercado, e o pré-sal atraiu poucos estrangeiros. O que houve?
David Goldwyn - O desafio do pré-sal é ser competitivo. Ao mudar o regime fiscal, exigir muito conteúdo local e mudar as regras de operação, o Brasil deixou a exploração mais cara que no México ou no noroeste da África. As empresas que queriam ir para o Brasil e que estavam interessadas estão olhando oportunidades em outros países.
O preço do petróleo tem caído. O pré-sal corre o risco de ficar pouco competitivo?
A obrigação de usar muito conteúdo local aumenta o custo dos investimentos. A obrigação de a Petrobras operar, além do peso administrativo para a Petrobras, prejudica a capacidade de gerenciar custos das empresas estrangeiras. Tudo isso atrasa prazos e coloca o petróleo do pré-sal na curva mais alta do preço do petróleo.
O Brasil criou um ambiente menos competitivo. Não sou otimista. O México está entrando em águas profundas, com menos conteúdo nacional, estrangeiros operando, mais concorrência. O preço será melhor. Mas, a longo prazo, o barril do petróleo deve estar acima de US$ 100, e acima de US$ 80 o pré-sal é viável. Há demanda.
A China salvará o pré-sal?
O Brasil parece confortável com investidores passivos que confiam totalmente na Petrobras --nas mãos dos chineses ou de fundos soberanos, que enfrentam menos obstáculos do que empresas que estão na Bolsa. Mas, agindo assim, renuncia à inovação que só vem da concorrência com operadores estrangeiros. Como observador, porém, admito que o Brasil impressiona pela flexibilidade. Vocês mudam de curso rapidamente, se adaptam. Os EUA não são tão ágeis.
Qual a percepção internacional da Petrobras?
Uma vez perguntei a um alto funcionário do governo do Brasil se a estratégia na Petrobras era para preservar reservas ou promover desenvolvimento imediato e crescente, e ele disse que era a segunda. Mas parece o oposto. A Petrobras está sobrecarregada.
Por quê?
A Petrobras precisa de concorrência. Ela tem que decidir muita coisa. Quando não há competição, seus custos sobem e a eficiência diminui.
A intenção do governo era fortalecer a economia e maximizar a produção, com uma fonte de renda justa para o Estado. Mas isso não foi feito de forma eficaz. Poderia ter sido feito com royalties e impostos, mas decidiram controlar a produção.
Apesar das tensões no Oriente Médio, o preço do petróleo está caindo. Por quê?
Os EUA tiveram um salto na produção de 3 milhões de barris diários nos últimos quatro anos. Acrescentaremos 1 milhão de barris diários no ano que vem. A Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) tem produzido sem parar, o Canadá está produzindo mais, e a Líbia cresceu. Isso compensa pausas no Iraque e no Sudão, a queda na Venezuela e as sanções no Irã. Com a Europa estagnada e a China desacelerando, a demanda não chega a empurrar os preços.