Mercado vê alta como 'recado' de Dilma
Para economistas, governo tenta reverter credibilidade abalada por medidas do primeiro mandato da presidente
Analista prevê que medida vá baixar taxas de juros de longo prazo e aposta na queda da cotação do dólar
A decisão do Banco Central de elevar a taxa de juros pegou de surpresa economistas e investidores. No mercado, a aposta corrente era que a autoridade manteria inalterada a Selic em 11% ao ano.
Para o ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros, sócio da consultoria Quest, o BC elevou a taxa para ganhar credibilidade e reatar laços com o setor privado.
"Dilma foi eleita por causa do desemprego baixo. Mas, se o crescimento não voltar, ele vai aumentar. E, para botar a economia para crescer, é preciso buscar uma política econômica que o setor privado considere necessária para investir", afirmou.
Na sua opinião, a decisão é um prenúncio de que o governo deve buscar também uma meta mais ambiciosa de economia dos gastos públicos, outro fator de desconfiança do setor privado e que é combustível para a inflação.
"Ela [Dilma] está dizendo ganhei com um discurso e vou governar com outro'", disse Mendonça de Barros.
Sua previsão é que o mercado deve responder derrubando as taxas de juros de longo prazo e apostando na queda da cotação do dólar.
Na avaliação de Maurício Molan, economista-chefe do Santander, o governo está se esforçando para emitir sinais de que adotará uma política econômica mais austera.
"Essa decisão aumenta a chance de haver sinais de austeridade antes do esperado também para a política fiscal", afirma Molan. "Há um esforço para gerar um choque favorável de expectativas."
O Santander prevê agora novo aumento de 0,25 ponto percentual na Selic, em dezembro. Para os economistas do banco, a taxa deve terminar 2015 em 12,5% ao ano.
Indicativos de que os alimentos vão pressionar ainda mais a inflação, assim como os efeitos da estiagem sobre os preços da energia elétrica, podem ter sido o sinal de alerta para o BC subir a Selic.
No mercado, já existem projeções indicando que a inflação pode superar o limite fixado pelo governo (de 6,5% ao ano) em 2015, primeiro ano do novo mandato de Dilma.
Reajustes típicos do início do ano costumam pressionar a inflação neste período, o que adiciona pressão a índice de preços já elevados.
O BC comprometeu-se em levar a inflação para a meta, de 4,5%, em 2016.
"Fica mais difícil chegar à meta quando se estoura o teto no ano anterior", diz Carlos Thadeu de Freitas Gomes, ex-diretor do BC.
Para José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, a surpresa é bem-vinda e evidencia a percepção de que a inflação está alta resistente, apesar desaceleração da atividade econômica.
O sócio do banco BR Partners José Flávio Ramos afirma que o BC se antecipou. "Se a inflação não responder, o BC pode subir mais [a Selic], mas acredito que tenha subido antes com o intuito de subir menos." (FABÍOLA SALANI, JOANA CUNHA E MARIANA CARNEIRO)