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Entrevista economia internacional
Saída para crise da Grécia exige trabalho de herói, diz jornalista
Autor defende estímulo fiscal e fim da austeridade para tirar país do buraco
Na mitologia, o deus Caos teria sido o primeiro a surgir no Universo. Só a partir dele vieram a noite, o dia e a ordem natural da vida. Na Grécia moderna, o caos começou em 2009, quando o parlamento anunciou que a dívida já passava de 12% do PIB.
A crise começou como a maioria dos descontroles. Ao gastar mais do que podia, tomando grandes empréstimos, a Grécia ficou refém dos credores. Em um país de alta informalidade e com dificuldade de recolher impostos, os cofres públicos sentiram a crise de crédito de 2008.
Para explicar o impacto da crise pela perspectiva dos gregos, o jornalista ateniense Yannis Palaiologos, 35, lança o livro "The 13th Labour of Hercules" ("O 13º Trabalho de Hércules", em tradução livre).
Ainda pela mitologia, Hércules deveria cumprir 12 tarefas para ser imortal. Na visão do autor, sobreviver às medidas da troika (grupo formado por Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI) impostas à Grécia para seguir na zona do euro exige a perseverança do herói.
Leia trechos da entrevista com o jornalista.
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Folha - A troika ainda é vista como uma vilã pelos gregos?
Yannis Palaiologos - A opinião pública grega tem sido mais hostil à troika do que a de outros países que passam pelo programa, como Irlanda e Portugal. Quem é de esquerda é contrário à austeridade, enquanto a direita enfatiza a perda da soberania nacional em relação à União Europeia.
Com a estagnação das maiores economias da Europa, o bloco vai conseguir apoiar a Grécia?
A Europa precisa abandonar o dogma da austeridade, o fetiche de orçamentos equilibrados --e o grande obstáculo é a Alemanha. Uma das maiores razões para a recuperação dos EUA é a expansão fiscal, que compensa o colapso da demanda privada.
A União Europeia precisa urgentemente de estímulo fiscal. Mais dinheiro no bolso das pessoas no norte do continente significa mais turistas no sul, incluindo a Grécia.
No livro, você aponta a dificuldade do governo grego em recolher impostos. Por quê?
Os governos das últimas décadas não mostraram vontade política ou capacidade administrativa para combater a evasão fiscal. Entre os gregos há um sentimento de grande desconfiança do Estado, que nunca foi visto como um guardião do bem comum.
A geração que chega ao mercado será marcada pela crise?
Sim, definitivamente. O desemprego entre os jovens está acima de 50%, salários baixaram, o financiamento para novos negócios é escasso. Esses gregos enfrentam a implosão do sistema de seguridade social e assumirão o ônus do ajuste de gastos.
A história seria diferente se o governo tivesse revelado as dificuldades financeiras antes?
Sim, mas isso pressupunha que os políticos, em um período de elevado crescimento e taxas de empréstimos baixas, tivessem a coragem de fazer os eleitores encararem a verdade, mas o jeito grego de fazer política tornou isso impossível. Os que tentaram avisar foram marginalizados.
Que lições vão ficar da crise?
Os gregos são muito talentosos, flexíveis, criativos. Espero que nos lembremos de que não se pode gastar mais do que se arrecada. Nada substitui o trabalho duro e a inovação.