Lucro da estatal cai e endividamento sobe
Sem mostrar corrupção, balanço da companhia, divulgado com 2 meses de atraso, é peça sem valor, dizem analistas
É "impraticável' quantificar valores de propina, mas lançados como investimento, afirma Graça Foster
Sem contabilizar perdas por desvios apontados na Operação Lava Jato, a Petrobras divulgou seu balanço do terceiro trimestre nesta quarta-feira (28), e os números mostram um fraco desempenho, com lucro e geração de caixa menores e endividamento mais elevado.
A frustração por a estatal não assumir o ônus da corrupção em suas contas se traduziu numa forte queda das ações da empresa na Bolsa --de 11,2% para as preferenciais e 10,48% no caso das ordinárias, com direito a voto.
A queda fez com que o valor de mercado da petroleira passasse de R$ 128,7 bilhões na terça-feira (27) para R$ 114,8 bilhões nesta quarta. Em 2010, a cifra era de R$ 380,2 bilhões, de acordo com a Bloomberg.
Mesmo sem contar as perdas, a estatal lucrou 38% menos no terceiro trimestre de 2014 --R$ 3,087 bilhões, ante R$ 4,959 bilhões no segundo. Foi o pior resultado desde o segundo trimestre de 2012 (prejuízo de R$ 1,3 bilhão). Os dados não contam com aval de uma auditoria independente.
O tombo decorreu, em parte, do prejuízo com a desistência de dois projetos de refinarias já em curso e do impacto da alta do dólar.
Esperado desde 14 de novembro e adiado duas vezes, o balanço mostrou ainda redução de 28% do Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização), indicador da capacidade da empresa de produzir caixa, que somou R$ 11,7 bilhões.
Já o faturamento da companhia cresceu 7% no terceiro trimestre --para R$ 88,4 bilhões. A alta foi puxada pelo crescimento de 6% da produção de petróleo.
No relatório sobre o balanço, a presidente da Petrobras, Graça Foster, classifica como "impraticável a exata quantificação" dos valores pagos como propina, mas lançados como investimento. Isso porque "os pagamentos foram efetuados por fornecedores externos e não podem ser rastreados nos registros contábeis da companhia".
TAMANHO REAL
O problema, dizem analistas, é que os dados divulgados nesta quarta-feira não revelam o real "tamanho" da estatal, sem considerar as perdas com corrupção, denunciadas pelo ex-diretor Paulo Roberto Costa.
"Como foi divulgado, o balanço poderia ter saído em 14 de novembro. Do ponto de vista contábil, é uma peça sem valor, pois não se sabe o real patrimônio da companhia. Sem assumir as perdas, não é algo confiável", diz Marco Aurélio Barbosa, analista CM Capital.
A Petrobras estimou uma perda de R$ 61 bilhões (já descontado o fato de que alguns ativos se valorizaram), mas não considerou esse cálculo no balanço nem lançou o valor como uma baixa em seus ativos.
Isso porque, alega a empresa, a fórmula para fazer esse ajuste não conseguiu separar os desvios de outros fatores que influenciaram o valor dos projetos envolvidos em corrupção, como impacto do câmbio, aumento de custo de insumos e atrasos em obras. A estatal diz que estuda uma nova metodologia.
Sem conhecer o patrimônio real da companhia, não se sabe a verdadeira situação das contas da estatal --o que piora a avaliação do mercado sobre seu endividamento.
As dívidas cresceram 18% entre o final de 2013 e 30 de setembro de 2014, chegando a R$ 261,4 bilhões.
O aumento se deveu ao peso da valorização do dólar sobre sua dívidas, cotadas em sua maioria em moeda americana. Com isso, piorou a chamada alavancagem, indicador que mede a dívida em relação ao patrimônio. O índice subiu de 39% no segundo trimestre para 43% no terceiro.
Se o nível de perdas a serem registradas chegar ao valor estimado e que não foi lançado no balanço, a alvancagem vai aumentar em até cinco pontos percentuais, estima a analista Karina Freitas, da corretora Concórdia.
Esse cenário dificultaria captações de recursos, elevaria o custo dessas operações e poderia levar até a perda da grau de investimento dado pelas agências de classificação de risco, segundo ela.
Com tamanha incerteza, afirma, a Petrobras foi até "conservadora" em seu corte de investimentos, que devem ficar entre US$ 31 bilhões e US$ 33 bilhões neste ano. Até setembro de 2014, a redução ficou em 10%.
Sem saber se terá acesso ao mercado de crédito, diz Freitas, a estatal deveria segurar mais seu orçamento para preservar o caixa.