E-mail liga lobista a caso que lesou o fisco
Depois de presidir o Carf, Edison Pereira Rodrigues garantiu a montadora "95%" de chance de vitória em recurso
Ex-presidente do conselho e escritório em que é sócio são investigados pela PF; ele não foi localizado
Em e-mail apreendido pela Polícia Federal, um ex-presidente do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) afirma que garantiria à Ford "95% de chances" de a montadora sair vitoriosa em um processo para reduzir ou anular multas da Receita.
O ex-presidente, Edison Pereira Rodrigues, é investigado pela PF na Operação Zelotes, que apura esquema de pagamento de propinas a integrantes do Carf, colegiado subordinado ao Ministério da Fazenda que analisa os recursos de contribuintes autuados pela Receita Federal.
A Folha tentou contato durante esta quarta-feira (1º)com o ex-presidente, por telefone, em seu escritório, e por e-mail, mas não conseguiu localizá-lo até a conclusão desta edição.
O e-mail, obtido pela reportagem, é de 2011, quando Rodrigues já havia deixado a chefia do órgão e atuava como lobista. Nele, Rodrigues afirma que a Ford "perderia com certeza" se não utilizasse seus serviços para recorrer de multas.
A montadora é um dos 74 alvos da polícia na operação. Ela não quis se pronunciar sobre o caso.
Para investigadores, a mensagem indica que a quadrilha que atuava no Carf tinha "facilitadores". Instituições privadas se utilizavam de lobistas com acesso aos conselheiros para reduzir seus débitos ou até zerá-los em "julgamentos viciados".
Rodrigues, na mensagem, cita ter "trabalhado para a Mitsubishi", com sucesso. A empresa também é investigada pela Operação Zelotes.
Rodrigues, que integrou o conselho entre 1995 e 2004, é pai de Meigan Sack Rodrigues --uma conselheira do Carf, segundo o site do órgão.
A mensagem fala em porcentagem de pagamento em caso de sucesso, o que poderia ser indício de propina, segundo investigadores. "Se eu participar [...], eles têm mais ou menos 95% de chances de ganhar. Caso contrário, perderão com certeza. A bola está com vocês. [...] Não pagarão mais do que 2% a 3%."
SERVIÇOS
Logo após deixar o Carf, Edison Pereira Rodrigues tornou-se sócio da SGR Consultoria Empresarial Ltda., na qual passou a se dedicar à advocacia. Outro de seus dois sócios, José Ricardo da Silva, também é suspeito.
A Folha obteve o contrato entre SGR e Mitsubishi. Nele, fica claro que, além de serviços advocatícios, poderia haver "assessoria empresarial no relacionamento institucional junto a instituições públicas e privadas".
O escritório cobrou R$ 2,5 milhões fixos e R$ 16 milhões se tivesse êxito em prorrogar benefícios decorrentes de uma lei que garantia créditos tributários para quem instalasse fábricas nas regiões Norte, Centro-Oeste e Nordeste, caso da Mitsubishi.
A montadora não quis se pronunciar sobre o assunto.
RACHID
O secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, disse nesta quarta-feira que decisões do Carf sob suspeita serão reexaminadas, mas só serão revistas as que tiverem manipulação comprovada.
"Há 74 processos administrativos que estão sob suspeita pelas informações de que nós já dispomos. [...] Mas não necessariamente os R$ 19 bilhões serão revertidos a favor da Fazenda Nacional", afirmo, durante sessão da CPI do SwissLeaks, no Senado, ao negar que a operação tenha como meta aumentar a arrecadação do governo.