Oasis high-tech
Centro do México atrai mais de US$ 10 bilhões em investimentos de montadoras multinacionais e recria cena imaginada pelo muralista Diego Rivera
Quando o artista mexicano Diego Rivera (1886-1957) pintou os famosos murais que retratavam o apogeu das indústrias de carros de Detroit, não imaginou que, pouco menos de um século depois, tais cenas já não seriam mais vistas nos EUA, mas ganhariam uma nova vida em seu próprio país natal.
Hoje, existem mais postos de trabalho nas indústrias de automóveis da região central mexicana do que em todo o Meio-Oeste norte-americano --onde se concentrava a produção no século passado.
De 2011 a 2014, o México atraiu mais de US$ 10 bilhões em investimentos de multinacionais para a região que inclui os Estados de Zacatecas, Aguascalientes, Guanajuato e Querétaro. Ali estão General Motors, Ford, Chrysler, Honda, Mazda, Toyota, Nissan, Audi e Volkswagen.
Nas últimas semanas, foram anunciados novos investimentos na zona, num total de US$ 3,5 bilhões. A produção automotiva mexicana, que desbancou a brasileira no ano passado, é a sétima mais volumosa no mundo, e o país posiciona-se agora como quarto maior exportador.
Num café no centro histórico de Guanajuato, o engenheiro francês Henri Ruffier, 28, conta que chegou à região para trabalhar como consultor da indústria há dois anos.
"Esperava encontrar um projeto mais embrionário, mas, desde o primeiro dia, notei a qualidade das instalações e o profissionalismo já como cultura vigente", diz à Folha. Entre os amigos que chegam para o happy hour, todos também funcionários do setor, vários estrangeiros.
Mas é o analista Jorge Reyes que observa: "Quando Rivera pintou aquele mural, sonhava com uma linha de produção em que se alinhariam trabalhadores de diferentes origens e raças. Não aconteceu tanto nos EUA, mas está acontecendo agora no México".
Essa espécie de oásis de prosperidade no meio de um país que enfrenta graves conflitos relacionados ao narcotráfico se beneficia da proximidade do principal destino de suas exportações de carros, os EUA. Mais de 80% da produção é para exportação, e mais de dois terços vão para o vizinho do norte.
Além disso, a facilidade de transporte por estradas renovadas (chega-se à fronteira dos EUA em oito horas) e o baixo custo do salário médio (em comparação com o de chineses ou norte-americanos) são os motores desse bom momento da produção.
O fato de o México ter tratados de livre-comércio com 44 países faz com que seja ainda mais atrativo para investimentos europeus, da China, do Japão e dos EUA.
Aos poucos, a região inverteu o fluxo migratório dos trabalhadores, que antes iam do sul buscar trabalho nas "maquiladoras", ao norte do país.
"Agora, ganha-se mais aqui e podemos estar perto de casa", diz a estudante Amalia Rosa, 21, que cursa engenharia numa universidade local, com bolsa de estudos paga por uma empresa.
As fábricas de automóveis são construídas ao redor de cidades históricas sem muita estrutura para abrigar a nova população. Em Querétaro, as montanhas foram tomadas por conjuntos residenciais construídos às pressas.
"Acho ótimo, aumenta o comércio. Só quero saber se alguém está pensando na barulheira e nesse trânsito, que só vai aumentar se continuarmos produzindo tantos carros!", diz José Villamizar, dono de um restaurante no centro da cidade, apontando para as estreitas e atravancadas ruas coloniais.