Cifras&Letras
Entrevista William Ury
Em boa negociação, não há vencedores nem perdedores
Antropólogo que ajudou a resolver disputa entre AbIlio Diniz e Grupo Casino lança livro
Habituado a mediar guerras civis, conflitos empresariais e familiares, o antropólogo e professor de Harvard William Ury, 61, afirma que negociar é uma oportunidade de encontrar soluções criativas em conjunto.
Coautor do best-seller "Como Chegar ao Sim" (1981), ele lança agora "Como Chegar ao Sim com Você Mesmo", no qual afirma que as negociações internas são tão ou mais difíceis do que as com oponentes inflexíveis.
Em entrevista à Folha, em São Paulo, Ury falou sobre seu método de negociação e contou como participou da solução do conflito envolvendo o empresário Abilio Diniz e Jean-Charles Naouri, presidente do grupo de varejo francês Casino, em 2013. A disputa foi encerrada com a saída de Diniz do Pão de Açúcar.
Folha - Como o negociador vira um obstáculo à conquista de seu objetivo?
William Ury - Em negociações, que deveriam ser racionais, somos emocionais. Ficamos irados com a outra parte e estragamos tudo ou ficamos com medo e desistimos do que buscávamos.
Como lidar com essas emoções?
Deve-se fazer algo que chamo de "ir para o camarote" e ver a situação de certa distância. É como se você se visse com a outra pessoa em um palco e observasse os sentimentos que passam por você.
Com isso, você entende quando fica com raiva ou com medo de acordo com cada ação da outra parte. Conhece seus sentimentos e aprende a não agir de acordo com eles.
Para negociar, é preciso fazer concessões?
É preciso ser flexível. Mas não vejo negociação dessa forma. Penso nela como um modo de solucionar um problema em conjunto. Numa transação comercial, em que quero vender algo com lucro e o cliente quer fazer o lucro dele, como podemos chegar a uma solução com a qual possamos ficar satisfeitos?
Deve-se deixar a percepção de que se dialoga com um adversário e mudar a questão de "quem vai desistir?" para "como vamos resolver esse problema?".
A negociação não envolve uma torta com tamanho fixo. Penso nela como forma de expandir a torta para que ela seja maior. Uma das partes pode pensar em como ajudar a outra a ter sucesso em seu negócio, pode fornecer informações, conhecimentos. Essa é a grande oportunidade da negociação, ser criativo.
O sr. começa e termina o livro escrevendo sobre a disputa entre Abilio Diniz e Jean-Charles Naouri, do Casino. Como se desenrolou esse caso?
Fui chamado pela mulher e pela filha de Abilio, que estavam preocupadas. O conflito se desenrolava havia dois anos e meio envolvendo processos judiciais e arbitragens.
Comecei convidando Abilio a "visitar o camarote", perguntando a ele: "O que você realmente quer?". Quando se pergunta esse tipo de coisa, geralmente as pessoas falam de suas posições concretas na negociação, como dinheiro, ações, eliminação de cláusulas, e esse foi o caso.
Disse a Abilio que ele tinha tudo o que se poderia querer na vida. Então qual seu real desejo? Ele respondeu que queria liberdade para passar tempo com a família e buscar seus sonhos nos negócios.
Após ele chegar a esse sim consigo mesmo, o conflito foi resolvido em três dias.
E os objetivos concretos da negociação, foram atingidos?
Essa é a coisa interessante. Ele conseguiu o dinheiro que queria, a eliminação da cláusula que queria e o resultado foi além do que esperava.
Quando os negociadores do outro lado me perguntaram em Paris o porquê de eu estar ali, respondi: "Porque a vida é muito curta e os dois lados sofriam com a batalha".
Sugeri que concordássemos em dois princípios, que não tinham a ver com dinheiro: liberdade para ambos os lados e respeito.
A partir daí buscamos uma solução justa para ambas as partes seguindo essas premissas, o que significou resultados como a eliminação das cláusulas de não competição para Abilio.
A essência desse método de negociar é que ele não é fácil, mas é simples. O desafio é mudar as suposições que fazemos da realidade. Há muito mais benefícios em resolver conflitos do que lutando, quando todos perdem.
COMO CHEGAR AO SIM COM VOCÊ MESMO
AUTOR William Ury
EDITORA Sextante
QUANTO R$ 29,90 (144 págs.)