Ucrânia volta às urnas em meio a guerra
Parlamento será renovado nas eleições deste domingo (26); bloco do presidente Poroshenko pode ter maioria
Líder pró-Ocidente quer consolidar poder; votação não ocorrerá em regiões sob controle de rebeldes separatistas
O Parlamento da Ucrânia é algo a meio caminho entre um espaço de luta livre e uma sala escura usada para fechar negócios escusos. Otimistas acreditam que as eleições deste domingo (26) vão mudar essa situação.
Eles esperam que a escolha de um novo grupo de deputados trará renovação para um país cuja vida é dificultada pela corrupção endêmica e pela dependência de uma indústria envelhecida, da época soviética.
Mas a guerra separatista que continua a ferver em fogo baixo no leste do país leva muitos outros a ter pouca fé.
O Verkhovna Rada, como é conhecido o Parlamento ucraniano unicameral, é um lugar barulhento, mesmo nos melhores dos tempos --o exemplo de um cenário político disfuncional. Os debates, com frequência, descambam em gritarias e às vezes em tapas e socos.
A eleição deste fim de semana representa o auge de um processo desencadeado pelo afastamento do presidente pró-Moscou Viktor Yanukovich, em fevereiro, em meio a uma revolta popular que se tornou violenta quando atiradores começaram a abater manifestantes perto da praça Maidan, em Kiev.
Eleito para a Presidência em maio, sem dificuldade, Petro Poroshenko aproveitou esse espírito e o usou em benefício de seu bloco político.
Apesar de os candidatos serem muitos, pesquisas indicam que o bloco de Poroshenko pode obter assentos suficientes no Parlamento, que tem 450 cadeiras, para formar um governo sozinho.
A maioria dos rivais compartilha um viés fortemente pró-ocidental. O afeto que a maioria dos ucranianos antes nutria pela Rússia foi azedado pela anexação russa da Crimeia, em março.
Os ânimos se acirraram desde a erupção de uma insurgência separatista armada, que a Ucrânia e o Ocidente dizem ser em grande medida fruto da interferência russa, nas regiões orientais do país, ricas em carvão.
Yulia Timoshenko, cujo carisma e tranças loiras a converteram em símbolo da Revolução Laranja de 2004, virou defensora ardente da participação da Ucrânia na Otan, e seu Partido da Pátria tem perspectivas razoáveis.
O primeiro-ministro Arseni Yatseniuk, líder do partido Frente Popular, virou defensor de reformas econômicas duras, porém necessárias.
O candidato mais chamativo é Oleg Lyashko, do Partido Radical, cujo misto de populismo nacionalista barulhento e altos gastos de campanha podem elevar seu grupo para o segundo lugar.
A campanha eleitoral tem passado por cima das questões substantivas, focando principalmente sobre apelos inflamados por patriotismo e renovação nacional.
Para o consultor político Oleksandr Kopil, há dois impulsos que motivam os eleitores na reta final.
"O primeiro é o desejo de estabilidade e de certa dose de segurança, para que as coisas não piorem, pelo menos", disse Kopil. "O segundo, que talvez tenha a adesão de menos pessoas, é que a revolução seja levada adiante, com reformas e mudanças acentuadas."
CONFLITO NO LESTE
Enquanto isso, a insurgência separatista pró-russa no leste do país lança uma sombra sobre as eleições.
Os combates, que já deixaram ao menos 3.000 mortos, perderam força desde o meio do ano, quando estiveram no auge. Mas os rebeldes estão se consolidando, e, sem uma solução clara em vista, existe a possibilidade de que os confrontos continuem.
A soberania territorial para a Ucrânia é um lema reiterado em todo o espectro político, e é pouco provável que o Parlamento a ser eleito queira um acordo com adversários que o governo descreve como "terroristas". A eleição não ocorrerá em áreas sob controle separatista.
O sentimento popular se divide entre o desejo de repelir os separatistas e a fadiga diante da morte e destruição causadas pelo conflito.
O apoio popular às campanhas de combate à corrupção é menos controverso. Numa manobra transparente para conquistar votos, Poroshenko pressionou o Parlamento em fim de mandato para que aprovasse uma lei prevendo a demissão de funcionários do Estado com vínculos com Yanukovich. Os eleitores esperam que o novo Parlamento siga o mesmo caminho.