Milícia seduz e ameaça meninos para que virem homens-bomba
Antes de a guerra atingir sua cidade síria, Usaid Barho jogava futebol e adorava filmes de Jackie Chan e a linda cantora pop libanesa Nancy Ahram. Queria ser médico.
Há pouco tempo, em Bagdá, Usaid, 14, se aproximou de uma mesquita xiita, abriu a jaqueta para mostrar um colete de explosivos e se rendeu aos guardas. "Estou com um colete suicida, mas não quero explodir", gritou.
"Nos seduziram para entrar no califado", disse, dias depois, ao dar uma entrevista monitorada por um agente da inteligência do Iraque.
Usaid foi recrutado pela milícia Estado Islâmico numa mesquita em Manbij, perto de Aleppo. Diz que se alistou por acreditar no islã. "Me plantaram a ideia de que os xiitas são infiéis e que devemos matá-los."
Ele afirmou que lhe disseram que, se não lutasse, os xiitas estuprariam sua mãe.
Logo que chegou ao Iraque, Usaid quis fugir. A melhor chance seria arriscada: ser voluntário num ataque suicida, para então se render.
Nas áreas que controla no Iraque e na Síria, o EI criou centros de treinamento de crianças, para criar uma nova geração de combatentes. Um vídeo do grupo os chama de "mascotes do califado".
"No passado, as crianças eram predominantemente mensageiros ou espiões", diz Laurent Chapuis, do Unicef, órgão da ONU para a infância. "Parece que agora são levadas a um papel mais ativo."
O relato de Usaid é um dos primeiros em primeira pessoa de um menino soldado que virou dissidente do EI.
Quando o grupo tomou sua cidade, ele foi levado à mesquita local. "Disseram que os xiitas estupravam as sunitas e matavam os homens."
Ele fugiu de casa por vontade própria, quando ia à escola, e foi para um campo de treinamento no deserto.
Ao final do treinamento, soube que seus instrutores queriam que ele lutasse no Iraque. Foi levado num micro-ônibus até Mossul. Seu alvo seria uma mesquita xiita no bairo de Bayaa, em Bagdá. No local, ele se entregou.
O agente que interrogou Usaid, falando sob condição de anonimato, disse que evitará um processo contra o menino. "Mesmo que ele vá ao tribunal, estaremos do lado dele, porque ele salvou vidas", afirmou.