Cidade de luto
Com 40 mil habitantes, Haltern tenta lidar com o trauma da morte de 16 estudantes e 2 professoras na tragédia aérea nos Alpes franceses
Na terça-feira (24), a estudante Laura Beer, 14, foi até a estação de trem de Haltern am See esperar a amiga Paula, que deveria chegar após desembarcar no aeroporto de Düsseldorf, a 89 km da cidade onde as duas moravam e se conheceram, ainda no jardim de infância.
Paula é um dos 16 estudantes alemães do colégio secundário Josef-König-Gymnasium, em Haltern, mortos a bordo do Airbus A320 da Germanwings, que se chocou contra os Alpes franceses.
"Fui para a estação, mas ela não apareceu. Foi só quando cheguei em casa que descobri o que havia acontecido. Meus pais me contaram do acidente e disseram que ela poderia estar no avião", relembra a garota.
A confirmação da morte de uma de suas melhores amigas veio à tarde. "É triste. Como uma pessoa que você conhece tão bem pode desaparecer do nada?"
Acompanhada de outras amigas, Laura foi à escola, onde ela e outros estudantes deixaram velas, mensagens e orações em homenagem aos 16 colegas e duas professoras mortos.
Nesta quarta (25), dia seguinte à tragédia, Haltern, com cerca de 40 mil habitantes, estava em choque. "O clima na cidade deve demorar muito para voltar ao normal", diz Benni Schröer, 17, aluno da escola.
O jovem fez um curso sobre a história dos judeus na Alemanha com uma das professoras vítimas da tragédia. "Eu não a conhecia bem, mas fiquei chocado ao saber que ela estava nesse voo", diz.
Em entrevista coletiva nesta quarta, o diretor do Josef-König-Gymnasium, Ulrich Wessel, lamentou o acidente e lembrou das duas colegas que estavam no avião.
Ambas eram jovens professoras: uma estava para se casar, e a outra havia se casado havia pouco tempo.
Wessel contou que cerca de 40 alunos haviam se candidatado para o intercâmbio, mas somente 16 foram sorteados para a viagem. O diretor afirmou não saber dizer se os programas de intercâmbio da escola vão continuar.
APOIO DE PROFISSIONAIS
No colégio, psicólogos, religiosos e outros profissionais treinados para situações de crise receberam alunos ao longo do dia --50 vieram de cidades da região nesta quarta para reforçar a equipe.
"Nesses momentos, é importante que os jovens não fiquem sozinhos. Por isso, providenciamos ajuda para que eles possam voltar aos poucos a seu cotidiano normal nas aulas e na cidade", disse a secretária de Educação do Estado da Renânia do Norte-Vestfália, Sylvia Löhrmann.
"Alguns precisam chorar, outros precisam ficar quietos. É preciso entender que cada um tem um jeito de lidar com a situação", acrescenta ela.
Na Alemanha, os profissionais treinados para lidar com situações de crises recebem o nome de "notfallseelsorger". A tradução literal da expressão para o português seria "cuidadores da alma para casos de emergência".
Esses profissionais têm ligação com a religião cristã, mas não são somente religiosos. São treinados para auxiliar pessoas que se encontrem em uma situação incomum, como a perda de alguém.
Bernd Klem, 58, outro profissional que visitou a escola, reforça que a melhor estratégia é não deixar os jovens sozinhos.
"A gente explicou para os alunos que é importante agora eles estarem juntos. Irem para escola juntos, voltarem para casa juntos e compartilharem o que estão sentido", explica ele.
Geralmente, os "notfallseelsorger" são chamados para atuar somente no dia do acidente. No caso de Haltern, o seu auxílio será necessário por mais tempo.
"Planejamos trabalhar aqui até sexta-feira, talvez com um grupo menor. Mas não sabemos ainda como serão as próximas semanas", afirma Klem.
O Estado do Renânia do Norte-Vestfália anunciou na tarde de quarta-feira que irá cobrir os custos dos tratamentos psicológicos dos colegas e familiares das vítimas, por meio de uma reserva financeira para casos de emergência. O Estado decretou luto até sexta-feira.
Muitas lojas e restaurantes da cidade fecharam suas portas nesta quarta.
Na porta de um açougue, lia-se a mensagem: "É difícil encontrar palavras".
Outros comerciantes da cidade também deixaram mensagens religiosas em suas vitrines. Na igreja, velas foram acesas em frente ao altar, acompanhadas de flores e imagens dos mortos.