'Governo isolou Argentina da região', diz presidenciável
Opositora, Margarita Stolbizer diz que Brasil devia ser prioridade do país
Embora com poucas chances de vencer, candidata tem atraído eleitores com críticas à gestão de Cristina
Mesmo com poucas chances de chegar à Casa Rosada (pouco mais de 3% das intenções de voto), a candidata opositora Margarita Stolbizer, 60, tem sido voz importante na corrida presidencial argentina, cuja largada ocorre no dia 9 de agosto.
A votação ocorre em 25 de outubro, e se desenha um inédito segundo turno, que ocorreria em 30 de novembro.
Ex-integrante da tradicional UCR (União Cívica Radical), a deputada vem amealhando apoio de eleitores do partido que se opõem à aliança firmada com o direitista Mauricio Macri (PRO) e de intelectuais progressistas, como a ensaísta Beatriz Sarlo, que se declaram não representados pelas três candidaturas à frente na disputa.
Stolbizer tem apontado o dedo para supostas irregularidades cometidas pela presidente Cristina Kirchner e pediu à Justiça a investigação das denúncias de lavagem de dinheiro relacionadas aos hotéis de propriedade da família Kirchner, na Patagônia.
Leia, abaixo, os principais trechos da entrevista à Folha, feita por telefone.
Folha - Por que a sra. considera sua candidatura diferente das outras?
Margarita Stolbizer - Estamos ocupando um lugar que estava vago. Nenhum dos candidatos com mais chances pode ser considerado progressista. Somos os únicos a falar de igualdade e de decência e a ter um programa que trate de temas como direitos humanos e ambiente.
O atual governo é considerado exitoso em sua política de direitos humanos, tendo ampliado e levado a cabo julgamentos dos crimes cometidos pela ditadura (1976-1983). Qual é sua proposta?
Concordo que o governo teve sucesso, principalmente sobre julgamentos de crimes de lesa-humanidade [crimes de Estado contra civis]. Mas não aprovo o uso político que fazem disso nem como tentam vender a ideia de que foram eles, na gestão Néstor Kirchner [2003-07], que começaram a julgar responsáveis pela repressão.
Esquecem-se do Julgamento das Juntas, durante o primeiro governo democrático, de Raúl Alfonsín [1983-1989], e de vários esforços e processos que existiram depois.
Porém o mais importante é que meu partido é o único que oferece continuidade aos processos. O candidato do governo, Daniel Scioli, não tem isso como prioridade.
O próximo presidente terá de lidar com a piora da situação econômica, num cenário internacional menos favorável. Como enfrentaria o problema?
Primeiro, reveria a política de subsídios. Quem vive em bairros nobres não paga quase nada por eletricidade, enquanto o custeio do transporte não beneficia o trabalhador, mas sim as empresas que proporcionam o serviço.
Porém creio que o problema mais sério seja a inflação [30%, segundo consultoras independentes]. O atual governo não a admite (o órgão verificador está sob intervenção) e não há políticas para contê-la. É o que mais afeta a população e o que mais faz aumentar a pobreza (em torno de 25% da população).
Qual sua proposta para a política exterior?
No Brasil, há certo ressentimento por a Argentina estar buscando se aproximar de outros países, descuidando da relação comercial com o vizinho. O Brasil é prioritário. Precisamos reconhecer sua liderança, enquanto o Brasil precisa de fato liderar.
A atual política exterior isolou a Argentina no continente, enquanto a aproxima de países que violam direitos humanos. Estamos ficando para trás em muitas coisas; uma delas é o acordo com a União Europeia, no qual o Brasil avança.
Se for eleita, antes mesmo da posse mandarei uma comitiva aos países estratégicos para a Argentina, a fim de redesenhar a relação com eles. O principal seria o Brasil.
Apesar da crise econômica e de episódios como a morte misteriosa do promotor Alberto Nisman, Cristina Kirchner tem 50% de aprovação popular. Qual o segredo?
Não creio nesses números. Ao mesmo tempo, há pesquisas em que 70% dos argentinos querem que ela vá embora logo. Há um cansaço generalizado com relação a seu estilo, sua arrogância. É um sentimento crescente.