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Jogadas descoordenadas
Os recentes avanços do Estado Islâmico, preocupantes em si, tornam ainda mais complexa a situação no Oriente Médio. Ameaçando tomar Kobani, cidade da Síria na fronteira com a Turquia, a milícia extremista obriga esses dois países, ao lado dos EUA e do povo curdo, a se movimentarem num xadrez geopolítico ao qual falta sobretudo coordenação das peças.
Enquanto o governo norte-americano cobra de Ancara participação ativa na coalizão que combate a facção radical, Recep Erdogan, presidente da Turquia, defende que a ofensiva militar priorize a deposição do ditador sírio Bashar al-Assad, cujo país vive sangrenta guerra civil há três anos e meio.
O ponto de vista de Erdogan revela tanto ambição por ampliar o poder regional de seu país como preocupação com os efeitos da turbulência no país vizinho. Cerca de 1,5 milhão de pessoas já deixaram a Síria e se refugiaram na Turquia.
Aos EUA, porém, não interessa aumentar o envolvimento no conflito sírio. Mais importante, neste momento, seria interromper o terror perpetrado pelos extremistas --algo que, tudo indica, não acontecerá tão cedo.
O risco de que Kobani caia nas mãos do Estado Islâmico tem crescido nos últimos dias. Caso isso venha a ocorrer, teme-se o massacre de milhares de civis que ainda não deixaram a cidade.
Embora o confronto já dure semanas, o Exército turco permanece estacionado na fronteira. A inércia militar se explica pela contenda que há décadas opõe a Turquia ao povo curdo, que se espraia pelos territórios turco, iraquiano, sírio e iraniano e reivindica um Estado próprio.
Na lógica de Ancara, ajudar os curdos significa ajudar um inimigo, já que o YPG, grupo que combate o Estado Islâmico em Kobani, é ligado ao PKK, organização nacionalista curda considerada terrorista pela Turquia.
Autoridades turcas receiam que uma possível vitória dos curdos fortaleça suas pretensões de criar uma zona autônoma na fronteira, a qual poderia servir como base para militantes do PKK.
Analisados seus últimos lances, a Turquia dá sinais de que prefere correr o risco de ver o grupo extremista islâmico fortalecido a conceder mais poder aos curdos.
Principal jogador nesse instável tabuleiro, o presidente americano Barack Obama precisa apresentar resultados e conquistar apoios efetivos na luta contra o Estado Islâmico. Será fundamental coordenar melhor as ações, incluindo as do Irã e do Iraque, para garantir a eficácia de sua estratégia.