Ruy Castro
Leviana
RIO DE JANEIRO - No segundo debate pela sucessão presidencial, o do SBT, Aécio Neves chamou Dilma Rousseff de "leviana". Referia-se, naturalmente, à maneira airosa, volátil e inconsistente (vide "Aurélio" e "Houaiss") com que a candidata manipulava os dados da economia. Ao ouvir aquilo, Dilma não ficou estarrecida. Na verdade, nem acusou recebimento. Mas Lula indignou-se. Bradou que não era coisa que se dissesse de uma mulher de mais de 60 anos, mãe e avó.
A princípio, atribuiu-se a reação de Lula à criatividade do ex-presidente, craque em submeter as palavras a tantos contorcionismos semânticos quanto as conveniências exigirem. Não era para tanto, pensou-se. Muito menos para que, a partir dali, se pintasse o adversário como um homem que não respeitava as mulheres. Mas, embora os dicionários não o registrem, alega-se agora que, em algumas regiões do Nordeste, "leviana" significa "mulher da vida". Donde, sem saber, Aécio Neves terá cometido suicídio linguístico.
Foi a vingança de Lula a uma acusação que sempre lhe fizeram: a de ser, quando muito, monolíngue. Opinião de que nunca compartilhei porque Lula é mestre em, pelo menos, duas línguas: a de uso corrente e a que lhe convém. O difícil é saber qual delas ele está falando.
É possível que o uso leviano de "leviana" não tenha tirado muitos votos de Aécio Neves --já estavam perdidos do mesmo jeito. Mas ficou claro que, nas próximas eleições, não será suficiente contratar um marqueteiro. Será preciso convocar também um linguista, para repassar com o candidato os pontos principais de sua argumentação e certificar-se de que nenhuma palavra se constituirá numa involuntária gafe regionalista, passível de exploração política.
Evidente que as mentiras, as ameaças e os golpes baixos, desde que bem urdidos e propositais, continuarão valendo.