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Ucrânia no limite
O fim negociado para o conflito civil na Ucrânia ficou mais distante após a realização, no domingo (2), de eleições parlamentares organizadas por separatistas pró-Rússia em Donetsk e Lugansk, regiões do leste do país.
Chamado de "tomada ilegal do poder" pelo governo central, o pleito representou um passo a mais rumo à fragmentação do território ucraniano. Nas duas regiões, os rebeldes proclamaram "repúblicas populares", e seus líderes se declararam chefes de Estado.
Como era de esperar, a iniciativa contou com o beneplácito do Kremlin, aliado dos insurgentes, e com a oposição de União Europeia e dos EUA, que apoiam o presidente ucraniano Petro Poroshenko. Este, por sua vez, afirmou que a decisão dos separatistas viola o acordo de cessar-fogo firmado entre seu país, a Rússia e os rebeldes.
Uma semana antes, eleições parlamentares realizadas em quase toda a Ucrânia --elas foram boicotadas nas regiões separatistas-- resultaram em ampla vitória dos partidos favoráveis à integração do país com a União Europeia.
A incapacidade de realização de eleições reconhecidas por governo e rebeldes dificulta as negociações e aumenta o temor de uma intervenção mais direta da Rússia. Foi o que ocorreu em março, quando, semanas após a deposição do então presidente pró-Moscou, Viktor Yanukovich, o aliado Vladimir Putin anexou a península da Crimeia, região de maioria étnica russa.
Com o acirramento das posições, o risco imediato é de recrudescimento da violência, que, nos últimos seis meses, custou a vida a 4.000 pessoas e provocou a fuga de outras 930 mil, segundo a Organização das Nações Unidas.
Obviamente, a reação de Putin será decisiva para o desenlace da crise. Nesta segunda (3), Moscou, que vem prestando auxílio militar e humanitário aos rebeldes, disse que "respeita" as eleições nas duas regiões, mas deixou em aberto o reconhecimento da independência.
Por outro lado, a União Europeia classificou as eleições nas regiões separatistas de "ilegais e ilegítimas" e vem pressionando Moscou a não repetir a ação na Crimeia.
Vizinhas entre si e fronteiriças com a Rússia, Donetsk e Lugansk têm populações que falam predominantemente o russo. Caso a aposta seja na força ao invés da negociação, o prolongamento do conflito fratricida continuará produzindo mortos e refugiados e dificultando o entendimento entre a Rússia e o Ocidente, trazendo assim um pouco mais de incerteza para a geopolítica mundial.