Editoriais
Terra estrangeira
A reforma do sistema de imigração norte-americano, prometida desde o primeiro governo de Barack Obama e parada no Congresso há um ano e meio, começou a andar por iniciativa do presidente.
Por meio de uma ação executiva (assemelhada aos decretos brasileiros), o mandatário dos Estados Unidos implementou algumas mudanças que favorecem cerca de 5 milhões de estrangeiros que vivem de forma irregular no país.
O decreto presidencial tem como principal objetivo proteger da deportação grupos específicos de imigrantes. É mais modesto, portanto, do que o projeto em tramitação no Capitólio --este abre espaço para que residentes ilegais obtenham cidadania americana.
O tema, porém, divide democratas e republicanos, o que paralisa os debates no Congresso. Foi esse impasse que levou Obama a agir.
Sua iniciativa beneficiará sobretudo os que vivem nos EUA há pelo menos cinco anos e tenham filhos registrados no país. Após alguns procedimentos formais, esses imigrantes poderão "sair das sombras", como disse Obama.
A oposição, como seria de esperar, estrilou. Os membros do Partido Republicano consideraram que o democrata excedeu o seu poder ao decidir a questão por conta própria. Prometem retaliações; dizem que interpelarão Obama na Justiça. Os mais radicais defendem o impeachment do presidente.
Sabem, todavia, que uma contraposição intransigente pode significar a perda de apoios nas eleições de 2016. Alterações nas leis imigratórias encontram grande ressonância na numerosa comunidade hispânica, por exemplo, que hoje perfaz cerca de 16% da população e 10% dos eleitores do país.
São o pragmatismo e o cálculo político que fazem o establishment republicano concentrar as críticas mais na forma do que no conteúdo do decreto de Obama.
A medida, de todo modo, encontra respaldo na sociedade. Pesquisa recente mostrou que 74% dos norte-americanos endossam um programa que dê cidadania a imigrantes sem papéis nos termos propostos pelo presidente.
São sinais alvissareiros, sem dúvida, mas devem ser vistos com cautela num país com tão longo histórico de discriminação e segregação de grupos e comunidades das mais diversas origens.
Os protestos em Ferguson --que se espalham pelo país-- devido ao não indiciamento do policial que há três meses matou um jovem negro mostram o quanto continua explosiva a tensão social nos EUA.