Bernardo Oliveira
Aumentar impostos e contribuições é a melhor solução para fechar as contas do governo?
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Não
Limitar desejos ao orçamento
Quando criança, ouvia muito meu pai falar que "tínhamos que limitar nossos desejos ao nosso orçamento". No fundo, ele estava me ensinando que só podíamos comprar aquilo que a renda familiar nos permitia. Quando ouvi que o governo está assumindo que terá um deficit de R$ 30 bilhões, pensei que seus representantes deveriam ter tido a mesma lição que recebi na infância.
Em vez de cortar despesas para equilibrar o Orçamento, o governo pretende aumentar a arrecadação com a elevação de tributos. Já fez isso com folha de pagamento, com as bebidas alcoólicas, com eletrônicos. Além disso, o governo pensa em criar um "imposto de travessia" para a época mais aguda da crise.
Segundo o próprio ministro da Fazenda, Joaquim Levy, esse imposto seria de caráter temporário, sem especificar, no entanto, a sua natureza: se imposto sobre a renda, se sobre consumo ou se a volta da famigerada CPMF.
Trabalho na área tributária há mais de 25 anos. Já presenciei diversas crises econômicas e aprendi com muitos pacotes tributários. Sei que o direito tributário possui características que não dependem de lei ou de decreto para serem validadas.
Uma delas diz respeito ao princípio da capacidade contributiva. Esse princípio busca uma sociedade mais justa em que a maior tributação recaia sobre aqueles que possuam maior riqueza. Isso significa que paga mais imposto quem tem maior poder econômico. Como fazer isso criando impostos sobre o consumo, onde o mais rico paga a mesma coisa que o mais pobre?
De acordo com estudo do Ipea, de 2008, a carga tributária representava 22,7% dos 10% mais ricos, enquanto para os 10% mais pobres a carga tributária equivalia a 32,8% de sua renda, comprovando o alto grau de injustiça tributária no Brasil. Boa parcela dessa injustiça está concentrada nos chamados impostos indiretos, aqueles embutidos nos preços dos produtos e serviços, tais como IPI, ICMS e ISS.
Se considerarmos que somente 5% da população possui uma renda mensal superior a R$ 6.780 e 46% da população possui uma renda de até R$ 1.356 por mês, conseguiremos comprovar que quem paga mais imposto no Brasil é, sem sombra de dúvidas, o pobre.
A tributação sobre o consumo é muito perversa e faz com que o imposto embutido no preço do feijão seja exatamente o mesmo, tanto para o rico, como para o pobre. Foi exatamente isso que o governo federal acabou de fazer ao aumentar o tributo dos computadores, dos tablets e das bebidas alcoólicas.
Todo o ganho incorporado pelas classes mais baixas de renda da população nos últimos anos está se exaurindo em razão do aumento de tributação que, num primeiro momento, parece aumentar a arrecadação, mas que, a médio e longo prazo, vão se equilibrar e voltar ao patamar de arrecadação anterior.
Isso é explicado por uma característica da economia: se o valor de determinado bem aumenta de preço, parece lógico que a demanda por esse bem não será igual à demanda anterior, com o preço mais baixo. Assim, não é dobrando o tributo que se pode dobrar a arrecadação do referido tributo.
Com o poder de compra reduzido pelo aumento dos tributos, haverá queda no consumo, que levará à queda na produção, que gerará desemprego, que resultará em economia estagnada, em uma espiral negativa e constante.
Assim, a única coisa que combate com eficiência a queda de arrecadação é o aumento da atividade econômica. E o governo sabe disso. Mas talvez não saiba como fazê-lo. Para tanto, recorre ao procedimento mais fácil, mas não o mais eficaz.