Ruy Castro
Eu fico
RIO DE JANEIRO - Há alguns anos, uma cantora –mais carioca, impossível– abriu seu show falando dos românticos anos 70, em que saía da boate em Ipanema às 4h da manhã e voltava a pé para casa, pelas ruas desertas. Na plateia, ouviram-se suspiros de saudade por aqueles bons tempos. Em seguida, ela cantou: "Rua Nascimento Silva, 107/ Eu saio correndo do pivete/ Tentando alcançar o elevador...". Era a paródia de Tom Jobim para a "Carta ao Tom 74", de Vinicius e Toquinho, de... 1976.
Afinal, os anos 70 eram ou não os bons tempos? Como ela podia voltar a pé para casa de madrugada se, naquela época, segundo Tom, não se saia à rua sem ser assaltado pelo pivete? Concluo que os anos 70 foram mesmo os bons tempos, mas só quando vistos dos anos 2000 –enquanto rolavam, faziam péssimo juízo de si mesmos. Eu me pergunto o que nós, de 2015, acharemos do Rio de 2015 em 2030.
Pesquisa recente feita aqui revelou que 56% da população gostariam de ir embora do Rio, alegando a violência. Tudo bem, mas para onde? Vejamos. Outra pesquisa desta semana, tabulada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, classifica o Rio em quinto lugar entre as capitais menos violentas do país, atrás apenas de São Paulo, Florianópolis, Boa Vista (RR) e Campo Grande (MS). É para estas que devemos emigrar, portanto. Não faz sentido ir para nenhuma das outras 22, se são mais violentas que o Rio.
Há duas semanas, os jornais deram grande destaque a uma jovem que teve seu celular roubado no Arpoador. Ao "Globo", ela desabafou: "Arpoador, nunca mais". Certo. Por coincidência, na página ao lado, o jornal noticiou um arrastão num prédio de luxo em Moema, em São Paulo. Foram levados joias, dinheiro, eletrônicos e eletrodomésticos de vários apartamentos. E nenhum morador saiu dizendo "Moema, nunca mais".
O carioca é muito afobado.