Questões de Ordem
MARCELO COELHO- coelhofsp@uol.com.br
Fora da curva
Não errou quem esperava o pior entre Collor e Janot ('Janó') na sabatina. Estava-se perto de ataques pessoais
O senador Fernando Collor (PMDB-AL) é sem dúvida um "ponto fora da curva" na política brasileira. Do PSOL ao DEM, passando por tucanos e petistas, em geral foi tranquila a sessão que analisou, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, a recondução de Rodrigo Janot à Procuradoria-Geral da República.
Só que, depois do audível "filho da puta" com que xingou Janot na tribuna, Collor era sem dúvida o interrogador mais esperado da tarde. Denunciado na Operação Lava Jato, o ex-presidente não dirigiu diretamente a palavra ao inimigo; a seu modo arrevesado, só se referia a Rodrigo Janot ("Janó", pronunciava ele) na terceira pessoa.
Não errou quem esperava o pior. Estava-se perto de ataques pessoais. Janot nomeou uma assessora para o cerimonial do Ministério Público que não tinha diploma superior. Que interesse haveria com essa nomeação? "Interesse público é que não", insinuou o senador de Alagoas.
Mais uma. Na década de 1990, Janot "homiziou" ("escondeu") um parente que era procurado pela Interpol. Collor deu o endereço do condomínio em que o tal parente ficou abrigado. Como alguém do MP pode dar apoio a um procurado da polícia?
A resposta de Janot teve impacto. "Era meu irmão." Não falarei, acrescentou o procurador, de alguém que não pode se defender. Sim, pois o irmão de Janot já faleceu. Face a tal resposta, as emoções do espectador tenderiam naturalmente a se inclinar em favor de Janot. Como Collor poderia voltar à carga depois de revelação tão forte? Exatamente por saber que era seu irmão, disse o senador, não quis citar o grau de parentesco... Quem puder que acredite nesse escrúpulo de delicadeza.
Outras dúvidas, como o aluguel de uma mansão pelo MP, que depois teve de ser desfeito, e a contratação de um assessor que teria prestado serviços "à campanha" de Janot à Procuradoria, foram levantadas não apenas por Collor. Tratados esses pontos, a sabatina percorreu caminhos mais doutrinários.
A presidente pode ser investigada por atos cometidos no primeiro mandato? A pergunta foi de Ronaldo Caiado (DEM-GO). Janot citou decisão do Supremo Tribunal Federal. Se decidiram que ela não pode ser responsabilizada criminalmente, a investigação não faz sentido.
Com boa dose de calor retórico, Jader Barbalho (PMDB-PA) formulou uma questão várias vezes levantada por advogados da Lava Jato. É justo soltar um acusado quando este se dispõe à delação premiada e deixar os outros "mofando na cadeia"? Como garantir a espontaneidade da delação, quando o juiz pode pressionar um acusado ao mantê-lo por meses na prisão?
Janot respondeu que 79% das colaborações foram acertadas com o réu solto –e que muitas prisões preventivas feitas por Sergio Moro foram confirmadas em tribunais colegiados.
Marta Suplicy questionou a posição de Janot quanto ao porte de drogas para uso pessoal (ele continua a favor da criminalização). Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) e Alvaro Dias (PSDB-PR) concordaram com Janot quanto a diminuir o número de autoridades com o foro privilegiado.
"Vá em frente", terminou o tucano da Paraíba, dando o tom geral da sabatina –uma verdadeira "aclamação", para usar as palavras de Randolfe Rodrigues, do PSOL. O senador ainda perguntou sobre a crise hídrica –mas aí o interesse da sessão já estava no volume morto.