Itu sem superlativos
A cidade paulista tem semáforo gigante e orelhão de 7 m, mas guarda tesouros mais singelos, como obras pintadas pelo padre Jesuíno
Esqueça o semáforo gigante, o sorvetão e o orelhão de sete metros de altura. A 102 quilômetros de São Paulo, Itu guarda tesouros mais singelos, como os azulejos de Afonso Taunay (1876-1958) no Museu Republicano e as igrejas pintadas pelo padre Jesuíno do Monte Carmelo (1764-1819).
Em 1937, quando trabalhava no Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Mário de Andrade viajava por São Paulo e arredores em busca de coisas dignas de serem tombadas.
Foi assim que o escritor paulistano descobriu as igrejas barrocas de Itu e se encantou com o "poder de exteriorização psicológica" das obras de Jesuíno.
A admiração de Mário de Andrade por Jesuíno era tamanha que o escritor dedicou dois ensaios e um livro ao artista. "Padre Jesuíno do Monte Carmelo" (Nova Fronteira, 384 páginas, R$ 48) disseca a vida e a obra do religioso e pode ser usado quase como guia turístico de Itu, com direito a capítulos sobre as igrejas matriz, do Carmo e de Nossa Senhora do Patrocínio.
Visitar as igrejas com o livro em mãos é ter Mário de Andrade como guia, direcionando o olhar do visitante para os aspectos mais interessantes do barroco paulista.
Neste ano, em que se relembram os 70 anos da morte de Mário de Andrade, que será o homenageado da próxima Flip (Festa Literária Internacional de Paraty), em julho, passear por Itu é uma forma de conhecer a obra crítica do escritor, além das pinturas de Jesuíno.
Filho e neto de escravas, Jesuíno era poeta, músico, pintor, arquiteto, escultor, encarnador, dourador e também entalhador.
Na igreja do Carmo, ele pintou os forros da capela-mor e da nave; na matriz, fez os painéis laterais da capela-mor; na igreja de Nossa Senhora do Patrocínio, encarregou-se de quase tudo. Desempenhou simultaneamente as tarefas de arquiteto, mestre de obras, pintor e escultor, além de produzir oito quadros e compor as músicas sacras que tocaram na inauguração da igreja.
Dessas obras, somente as da matriz não podem ser vistas no momento. A igreja está aberta, mas a capela-mor está sendo restaurada (a previsão é que fique pronta no começo de 2016).
Durante o restauro da matriz, foram encontradas, sob camadas de tinta, obras de Jesuíno e de José Patrício da Silva Manso, outro expoente da arte sacra brasileira.
Estima-se que as pinturas estivessem escondidas por quase dois séculos. Entre elas, está um conjunto de tábuas pintadas por Jesuíno que foram encontradas em 2014, protegendo o relógio da fachada da igreja. As tábuas podem ser vistas na Casa da Praça até o dia 2 de agosto.