Em HQ, cartunista conta a história de Edward Snowden e o considera herói
Humor e Erotismo
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O sexo é a força motriz de Milo Manara, famoso pela série "Clic". Menos conhecidas são as narrativas curtas em que traça perfis ou conta passagens pouco conhecidas de personagens históricos ""sempre tendo o erotismo como motor predominante. A combinação única entre humor nonsense, erotismo sutil e traço elegante, quase fotográfico de tão realista, fica evidente no trato que o artista dá à história ""com licença poética, claro, nem sempre com preocupação em ser fiel aos fatos: sua intenção é sempre fazer o coração disparar e os olhos esbugalharem.
Em "Câmera Indiscreta", Manara reúne algumas de suas HQs mais intrigantes, com personagens como Marcello Mastroianni, Federico Fellini, Casanova, Picasso, Borges, John Lennon, Pavarotti e Charlie Chaplin contracenando com as onipresentes mulheres de corpos perfeitos, marcas registradas do desenhista.
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Já em "Quimeras", além de trazer uma história protagonizada por Caravaggio ""tema de uma série de graphic novels que o autor italiano lançaria mais tarde"", Manara traz sensualidade a uma história de Asterix, faz sua versão particular de Barbarella e usa cores que lembram Marc Chagall, em narrativas que estrelaram revistas como "Frigidaire" e "Totem". No estilo, além de Hugo Pratt, outro mestre a quem Manara rende homenagem é Moebius. (Ronaldo Bressane)
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AFRODITE
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Como eram ingênuos os anos 70! Curitiba, então, nem se fala. Enquanto o Vampiro mordia semivirgens pelas ruas, o casal Alice Ruiz e Leminski bolava tórridas historinhas de sacanagem na Grafipar, editora que juntava talentos emergentes da cidade, tão fria e carola quanto melíflua e safada. Ali eram sacadas as revistas "Atenção", de política; "Eros", masculina; e "Rose", feminina. Todas tinham HQs curtas, ilustradas por craques como Flávio Colin, Júlio Shimamoto, Marília Guasque etc. Apesar da libido ilibada do casal, vivia-se sob ditadura e na conservadora Curitiba: nada de palavrões ou nu frontal, o erotismo aqui se aproxima mais da pornochanchada que da sofisticação de Manara.
Nos roteiros de Leminski há humor; nos de Ruiz, feminismo ""como retratos de heroínas que (oh!) ousam dar pra quem querem. O esquematismo das narrativas e a estética hiper-naturalista tornam as HQs datadas. Outro problema é a redução do tamanho original, de revista para livro, o que turva a leitura de HQs mais ousadas como "Fuga", em que um assassino de mulheres se dá mal ao cair em um presídio feminino. (RB)
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UMA VIDA CHINESA
O quadrinista chinês Li Kunwu começou a carreira como cartunista de um jornal em Kunming, no sudoeste da China. Sua produção é abundante: em 30 anos de carreira, publicou 30 livros. É um dos raros casos de autor que vive exclusivamente de HQs no país, com trabalhos esporádicos publicados em revistas europeias.
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A fama fora de lá veio com a trilogia "Uma Vida Chinesa". O projeto começou em 2005, quando o artista recebeu convite de editor estrangeiro. O objetivo seria mostrar a China ao mundo por meio do olhar de uma pessoa comum. O resultado são mais de 700 páginas da saga de três volumes escrita com o diplomata francês Philippe Ôtié.
O primeiro começa em 1950, quando seus pais se casam e lutam para criar os dois filhos num país convulsionado pela revolução. A história prossegue até a morte de Mao Tsé-tung, em 1976, em dois grandes capítulos. Quem espera uma HQ orientalizada vai se decepcionar: a influência dos mestres europeus é clara, tanto pelo belo desenho fluido em branco e preto como pela disposição dos quadrinhos. (MARIO BRESIGHELLO)
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Ilustracao de Lin Kunwu para "Uma Vida Chinesa" |
SNOWDEN, UM HERÓI DO NOSSO TEMPO
As histórias em quadrinhos têm se mostrado um suporte versátil para veicular ideias, não somente narrativas de ficção. Bom exemplo lançado em 2015 é o ensaio visual "Autocracia", de Woodrow Phoenix (Veneta), acerca do apocalipse motorizado da atualidade, e são bem conhecidas no país as HQs de não ficção de Joe Sacco, fortemente aparentadas à tradição do jornalismo de guerra.
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Em "Snowden, Um Herói de Nosso Tempo", Ted Rall, o cartunista editorial do jornal "The Los Angeles Times", se aproxima da seara das obras didáticas com apelo infográfico, relatando cronologicamente a história de Edward Snowden, ex-administrador de sistemas da NSA, a Agência de Segurança Nacional dos EUA, de onde roubou milhares de informações que revelaram ao mundo o que Big Brother fazia conosco: vigiar, e da maneira mais invasiva possível.
Snowden, perseguido como cibercriminoso, também revelou que o governo norte-americano infringia sua própria constituição, invadindo a privacidade de cidadãos inocentes, e não somente suspeitos. Ótima introdução ao assunto, como assinala Noam Chomsky na contracapa. (JOCA REINERS TERRON)