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09/10/2012 - 18h28

Projeto genômico para o mundo da arte está on-line

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MELENA RYZIK
DO "NEW YORK TIMES"

Qualquer fã musical sabe que existem várias maneiras de encontrar canções novas on-line: vasculhar playlists digitais e serviços de rádio streaming como o Pandora, que funcionam como motores de recomendações musicais. Do mesmo modo, os assinantes do Netflix recebem enxurradas regulares de sugestões de, por exemplo, comédias românticas ou filmes de horror; as recomendações são baseadas nos filmes vistos anteriormente.

Mas até agora não existia nenhum sistema de recomendações automatizadas para amantes de artes plásticas em busca de descobertas online --nada como "se você gosta de 'Nº 1', de Jackson Pollock, talvez também aprecie 'Nº 18', de Mark Rothko".

É aqui que entra a start-up Art.sy, cuja versão pública entrou no ar na segunda-feira. Extenso repositório gratuito de imagens de belas-artes e guia on-line de apreciação de obras de arte, o site se fundamenta na ideia de que o público que se sente à vontade com sites baseados em imagens, como Tumblr e Pinterest, está disposto a passar horas olhando telas e esculturas em seus monitores e tablets, especialmente dispondo de ajuda a um clique de distância.

Depois de dois anos sendo testado reservadamente e de milhões de dólares injetados por investidores, entre os quais estão algumas celebridades dos mundos da arte e da tecnologia, o site quer fazer pela arte visual o que o Pandora fez pela música e o Netflix, pelo cinema: virar fonte de descobertas, prazer e educação.

Tendo como parceiros 275 galerias e 50 museus e instituições, o Art.sy já digitalizou 20 mil imagens em seu sistema de referência, ao qual deu o nome de Projeto Art Genome. Mas, ao mesmo tempo em que estende o alcance da plataforma, o Art.sy também suscita perguntas sobre como (ou se) a analítica digital deve ser aplicada à arte visual. Será que algoritmos podem ajudar a explicar obras de arte?

Robert Storr, reitor da Escola de Arte da Universidade Yale, tem suas dúvidas. "Depende tanto da informação, de quem está fazendo a seleção, quais são os critérios e quais são as premissas culturais por trás desses critérios", disse Storr, ex-curador de pintura e escultura no Museum of Modern Art. Em termos de compreensão artística, disse ele, "tenho certeza de que será redutivo".

A tecnologia, pelo menos, é expansiva. Para fazer sugestões válidas, os computadores precisam ser ensinados a fazer avaliação humana especializada, processo que começa pela rotulação: são dados códigos à máquina para que ela possa diferenciar um retrato renascentista de uma pintura modernista gotejada, por exemplo, e então ela poderá vasculhar obras intermináveis, fazendo comparações e traçando conexões.

Para o projeto Art Genome, Matthew Israel, 34 anos, que tem um Ph.D. em arte e arqueologia do Instituto de Belas-Artes da Universidade de Nova York, comanda uma equipe de uma dúzia de historiadores da arte que definem quais são esses códigos e como devem ser aplicados. Alguns rótulos (o Art.sy os chama de "genes" e reconhece 800 deles, sendo que mais são acrescentados diariamente) denotam qualidades bastante objetivas, como o período histórico e a região de onde vem um trabalho, se o trabalho é figurativo ou abstrato e se faz parte de uma categoria reconhecida, como cubismo, retratos flamengos ou fotografia.

Outros rótulos são altamente subjetivos, até esdrúxulos; no caso da arte contemporânea, por exemplo, os curadores da Art.sy podem usar termos como "globalização" e "crítica cultural" para conferir contexto ideológico. "Traços contemporâneos de memória" é um tema elástico atribuído a trabalhos do artista conceitual chinês Cai Guo-Qiang e ao fotógrafo e cineasta Matt Saunders.

Um Picasso pode receber os rótulos "cubismo", "pintura abstrata", "Espanha", "França" e "amor", todos termos que são visíveis e podem ser buscados no site. Os trabalhos de Jackson Pollock geralmente recebem os rótulos "arte abstrata", "Escola de Nova York", "espirrado/gotejado", "repetição" e "orientado pelo processo". Como seria previsível, os mesmos critérios aparecem nas pinturas dos contemporâneos de Pollock Robert Motherwell e Willem de Kooning, mas também nas de artistas de eras e estilos diferentes, como Tara Donovan, cujas esculturas abstratas contemporâneas usando espuma plástica e pratos de plástico empilhados também foram assinalados com o rótulo "repetição".

À medida que as categorias são aplicadas, cada obra recebe um valor que vai de um a cem; Andy Warhol pode receber escore alto na escala Pop Art, enquanto um artista pós-warholiano teria escore diferente, dependendo de suas influências. Os softwares podem ajudar a filtrar as imagens para classificar qualidades visuais básicas, como a cor, mas o julgamento que é feito é basicamente humano.

"Literalmente, uma pessoa intervém manualmente e anota um número em todos os campos relevantes", disse Matthew Israel.

A complexidade técnica é menor que os desafios de curadoria. "Descobrimos que os dados têm muito mais importância que a matemática", disse Daniel Doubrovkine, 35, encarregado de engenharia na Art.sy. "Como podemos apontar com uma máquina algo indicativo de emoção? Isso não acontece."

Do mesmo modo, o Pandora tem um grupo de musicólogos que fazem a desconstrução de cada música, e sua análise é inserida num algoritmo, chamado o Projeto Music Genome, que recomenda canções baseadas no gosto dos usuários e nos escores que eles atribuem a cada faixa. Joe Kennedy, o executivo-chefe do Pandora, atuou como consultor do Art.sy.

Mas o Art.sy se propõe a traçar conexões entre obras de arte que, aparentemente, pertencem a mundos distintos, com um catálogo que abrange trabalhos que estão no Museu Britânico, na National Gallery de Washington, no Museu de Arte Contemporânea de Los Angeles, e outros. Um parceiro recente do projeto, o Museu Nacional Cooper-Hewitt de Design em Manhattan, um ramo do Smithsonian, acrescentou objetos ao todo; será um teste da tecnologia do site e dos paralelos que ele vai traçar, disse Seb Chan, diretor de mídia digital e emergente do Cooper-Hewitt.

Culturalmente falando, "qual é o significado de se recomendar uma pintura depois de ver uma colher do século 7, por exemplo?", ele explicou. Prevendo perguntas como essa, a equipe do Art.sy tem um blog explicando como funciona seu processo.

O fundador e executivo-chefe Carter Cleveland, 25 anos, idealizou o Art.sy quando era estudante na Universidade Princeton e não conseguiu encontrar um trabalho de arte de que gostasse para decorar seu alojamento universitário. Ajudado por sua família --seu pai é escritor sobre arte, e sua mãe é financista--, depois de se formar ele conseguiu atrair parceiros como o galerista Larry Gagosian e investidores como Dasha Zhukova, figura conhecida no mundo das artes, e Wendi Murdoch, a mulher de Rupert Murdoch, que o apresentou a outras pessoas. Eric Schmidt, do Google, e Jack Dorsey, do Twitter, também são investidores no projeto, e John Elderfield, ex-curador chefe de pintura e escultura no Museum of Modern Art, presta assessoria.

Com o apoio deles, Cleveland ficou livre para implementar sua visão ambiciosa para o site. "O mundo inteiro da arte ficará aberto a qualquer pessoa que disponha de uma conexão com a internet", ele disse, formulando um lema da empresa, se bem que não seja um plano para obter lucros. A receita está prevista para entrar com comissões sobre vendas e parcerias com instituições.

Mas o Art.sy está longe de conter toda a arte do mundo --o Google Art Project, outro repositório de imagens, tem quase o dobro de suas dimensões --, e o genoma tem apenas a força de seu acervo limitado. Um aficionado das antiguidades gregas ou romanas não o acharia muito útil hoje --uma omissão cultural comparável a o Netflix não ter filmes de Hitchcock. Robert Storr, de Yale, também se preocupou com a possibilidade de os buracos no banco de dados serem preenchidos com as coisas erradas.

"Este lugar está cheio de arte péssima para a qual ninguém deveria ser direcionado", ele opinou, depois de examinar o site.

Os fundadores do Art.sy argumentam que, como a compreensão da arte é algo que está em constante evolução, não é possível seu projeto ser um guia definitivo. "É mais o caso de dizer que estas podem ser plataformas interessantes a partir das quais decolar", disse o executivo operacional chefe do site, Sebastian Cwilich.

Seb Chan, do Cooper-Hewitt, disse que sites como Art.sy não se propõem a tomar o lugar de museus, galerias ou livros, mas sim ajudar o público, especialmente os neófitos em arte, a ampliar os limites de seu gosto. "Não deveria ser preciso ser estudioso de arte para descobrir obras de arte que podem fasciná-lo", ele explicou. "Você vai a museus e olha tudo, podendo topar com coisas que lhe dizem muito. O Art Genome é outra maneira de criar conexões que fazem sentido. Para nossa cultura, especialmente para as pessoas que vivem com a Web como parte de sua vida natural --qualquer pessoa com menos de 25 anos--, essa é uma maneira natural de procurar imagens."

Tradução de CLARA ALLAIN

 

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