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23/11/2012 - 16h47

'Relação com domésticos é diferenciada', diz sindicato das patroas

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ANNA CAROLINA RODRIGUES
COLABORAÇÃO PARA FOLHA

Atualizado às 16h47.

Tramita no Congresso uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que amplia os direitos de trabalhadores domésticos -- que além das domésticas e babás, também inclui jardineiros, motoristas e copeiros.

Deputados votam a favor de proposta que amplia direito das domésticas
Advogados sugerem banco de horas para domésticas

A PEC concede a esses trabalhadores todos os benefícios já previstos na Constituição para outras categorias (veja no quadro abaixo).

A proposta tem prazo mínimo de cinco sessões para que seja feita a votação de 2º turno na Câmara. Em seguida, ela precisa ser votada, também em duas sessões no Senado. Feito isso, segue para sanção presidencial.

Em entrevista à Folha, Margareth Carbinato, 58, advogada trabalhista e presidente do sindicato das patroas do Estado de SP desde sua criação em 1989, disse que muitos dos benefícios "não fazem sentido, pois a relação entre empregador e funcionário doméstico é diferenciada", uma vez que o trabalho desse profissional "não gera lucro direto" para o quem contrata.

A seguir, trechos da entrevista:

*

Folha - Como a senhora avalia PEC das domésticas?

Margareth Carbinato - É justo as pessoas reinvidiarem o que desejam, mas acho que ninguém está pensando nas consequências caso as reivindicações sejam aprovadas. Não adianta o empregado doméstico ter tantos direitos se os empregadores --que são em grande maioria pessoas de classe média, além de aposentados pela previdência-- não tiverem condições de arcar com esses custos.

Muitos empregados também são patrões. Trabalham na casa de alguém e contratam empregada para cuidar dos filhos dela. Mas será que elas terão condições de continuar a pagar isso?

A Constituição já previa todos os novos benefícios para os trabalhadores de outras categorias. Por que não para os domésticos?

A categoria do empregado doméstico é diferenciada. Em primeiro lugar, porque não aufere lucros para o empregador. Em segundo, porque ela é uma categoria que tem outros benefícios que não são contabilizados, como alimentação, por exemplo. O empregador fica sem jeito de cobrar alimentação e não vai falar para o funcionário ir "comer na esquina'.

Em outros casos, o empregado reside na casa do empregador. Esse é um custo que o empregado deixa de ter e que acaba indo para o bolso do patrão. É um dinheiro que ele deixa de ganhar, pois o aluguel de um quarto hoje não é menos de R$ 1.000.

A realidade brasileira é diferente das outras, temos um pais com dimensão demográfica e com uma variedade tremenda de situações econômicas e culturais e financeiras. Pessoas vem [para São Paulo] de outros estados, sem condições de mercado e precisam de uma casa para trabalhar e morar. A PEC vai atrapalhar isso.

Desde 1989, pedimos para que o empregador possa abater todos os gastos com empregado, que é quase um dependente econômico do empregador. Mas o legislativo não ve esse tipo de coisa, em vez disso só aumenta a taxação e obrigação nos ombros dos empregadores. Se ainda existem milhões de empregados domésticos, é porque ainda existe empregador.

A senhora acha que a proposta, caso aprovada, irá vingar?

Vai gerar desemprego, sem dúvida. Como o patrão vai controlar a jornada de trabalho? Vai botar cartão de ponto? Como ele vai fazer isso se muitas vezes ele sai antes do funcionário chegar e chega depois? Não tem como controlar essa jornada...

Além disso, a pessoa que dorme na casa, vai ficar lá 24h como se estivesse à disposição. Mas nem sempre é assim, ela também tem hora livre, dorme, assiste à novela. O problema é que agora ela vai poder reivindicar isso, pois o patrão é cerceado na Justiça da prova testemunhal. Quem são as testemunhas de uma residência? São os residentes, ou amigos, ou familia, enfim, pessoas que são impedidas de testemunhar.

Na sua opinião, qual seria a melhor alternativa?

O que precisa haver é uma modificação na lei trabalhista para que não seja preciso equiparar, em 2012, os empregados domésticos à uma legislaçao de 1940. É preciso haver mecanismos que gerem uma pluralidade de mercado de trabalho para adequar a necessidade do empregado e empregador.

Quais benefícios a senhora sugere para as domésticas?

Vou citar um exemplo de contratos que existem. Em Portugal, as partes definem, em contrato, qual a forma de pagamento, jornada de trabalho etc. Não sou legislador, mas nós, como representates da categoria dos empregados domésticos poderíamos participar de uma mesa --como ocorreu no governo Lula-- para pensar uma solução.

Não é concedendo direitos que a situação do empregado doméstico vai melhorar. Acho que é preciso regulamentar o que já existe. Outra coisa, creche é obrigação do governo e não do empregador.

No caso das diaristas, não haverá alteração...

A questão da diarista é um problema. Os nossos legisladores, em vez de definir a legislção, colocam no ombro do judiciário a responsabilidade da decisão. Um ou três dias de trabalho criam vínculo? Ninguém chega a uma conclusão. O poder judiciario não é o legislativo. Isso conturba os lares brasileiros que precisam do trabalho de uma diarista.

Existem decisões no país que dizem que menos três dias tem vínculo. Como fica o empregador sem a garantia de nada? Isso precisa ficar claro aqui para evitar confusão. Acho que o número de diaristas tende a aumentar, assim como os problemas da Justiça do Trabalho, caso essas questões não sejam definidas.

Alex Argozino/Editoria de Arte/Folhapress
Doméstica
Doméstica

Um estudo do Dieese mostra que quase metade das empregadas domésticas de SP, MG e DF são mensalistas com carteira assinada. Mas nos últimos dez anos também houve aumento de diaristas.

Aconselhamos no sindicato que os empregadores façam o registro do funcionário doméstico, caso contrário, terá que recolher tudo depois e pagar multa. Mas não sei de onde o Dieese tira isso. Nunca foram na minha casa perguntar isso, não acho que amostra mostre a realidade.

Diarista não é empregada, então, não tem carteira. Acredito que esse número deva ter aumentado mesmo, pois o empregador levou um choque quando essa categoria ganhou o direito à estabilidade gestante [Lei n.º 11.324, de 19 de julho de 2006].

Ela garante emprego e salário desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Se ela descobre que está grávida no segundo mês, o empregador, se quiser mandá-la embora, é compelido a pagar um total de 12 meses de salário, fora o aviso prévio e a incidência sobre férias e 13º salário.

Isso é bom para os bons empregados, mas maus empregados podem acabar tirando proveito da situação, faltando ao emprego, por exemplo. A PEC prevê ainda outros benefícios como adicional norturno e outras incidências, creche, FGTS etc. Alguns fazem sentido, mas estão assustando o empregador.

Qual a senhora acha que seria a dinâmica mais justa para equilibrar o direito entre patroas e domésticas?

Livre negociação, como tem em Portugal e em outros países da Europa. Respeitando 13º salário, férias, salário mínimo, enfim, os direitos básicos. FGTS também, mas sem a multa. Acho 8% muito pesado para o empregador como depósito fundiário.

Folha -Em alguns países, ter um empregado doméstico é considerado luxo. A senhora acha que isso pode acontecer aqui?

Nos Estados Unidos, a realidade é outra. Aqui no Brasil, ainda temos um contingente muito grande de pessoas analfabetas --e vai ficar cada vez pior, pois ninguém pensa em elevar o salário dos professores, de quem educa.

Empregado doméstico tem salário maior e mais benefícios do que os professores. Essas pessoas não vão ter condições de disputar mercado com quem teve educação. O problema migratório no Brasil é gravíssimo. Muitos não têm profissão nem experiência profissional para disputar o mercado. Muitas vezes, essas pessoas economicamente prejudicadas e desprovidas precisam morar na casa de alguém para trabalhar e ganhar dinheiro.

Mas será que a tendência não é que essas pessoas busquem outras profissões e mais qualificação?

Vão ter que fazer isso, né? Os empregadores não vão ter condições de empregá-las. Mas acredito que muitos não vão ter preparo educacional nem profissional para encarar outras profissões.

 

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