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16/11/2012 - 18h38

Análise: Presidente egípcio tem espaço limitado para apoiar o Hamas

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MARWA AWAD
DA REUTERS

Os islâmicos no poder no Egito estão trabalhando para firmar uma trégua na faixa de Gaza, tanto para mostrar a sua influência regional, quanto para reassegurar seu maior doador, os EUA. Mas a retórica endurecida contra Israel para acalmar sua nervosa base de apoio não deve se traduzir em ações.

Formular uma resposta aos ataques de Israel a Gaza apresenta um dilema para a Irmandade Muçulmana, grupo que apoiou a ascendência do presidente Mohamed Mursi ao cargo e passou anos criticando o ditador Hosni Mubarak, destituído, por aproximar-se de Israel.

Os islâmicos têm agora que agir de acordo com sua oposição de décadas a Israel, mas balanceá-la com as realidades de governar uma nação, evitando aumentar tensões nas fronteiras ou irritar Washington, um grande patrocinador do Exército egípcio.

Essas realidades devem, por ora, ter prioridade na tomada de decisões, mesmo que alguns simpatizantes da Irmandade tenham planos de longo prazo para renegociar o tratado de paz de 1979, assinado entre os dois países.

Mursi, que assumiu o cargo em junho, retirou seu embaixador de Israel e seu primeiro-ministro visitou Gaza na sexta-feira, em uma demonstração de solidariedade. Mas até mesmo Mubarak retirou seu enviado a Tel Aviv duas vezes sem pôr o tratado em risco.

"A atual liderança e a Irmandade Muçulmana não estão dispostas a arriscar suas relações com a América", disse à Reuters um oficial sênior da Irmandade ligado à Presidência, que pediu anonimato.

"Gaza continuará sendo uma questão de segurança nacional sob o comando dos serviços de inteligência do Egito. A Presidência segue esse acordo, por hora", ele disse.

O Exército, que recebe US$1,3 bilhão em auxílios por ano dos EUA, continua à frente de assuntos de segurança nacional tais como as ligações com Israel, apesar de Mursi ter podado o poder dos militares em agosto, ao demitir alguns dos principais generais.

Oficiais americanos em Washington disseram à Reuters que Mursi passou meses tentando marcar uma data para encontrar com o presidente Barack Obama e polir suas credenciais de islâmico moderado, sem sucesso.

Depois de um telefonema com Obama, Mursi publicou decisão de enviar seu primeiro-ministro a Gaza, uma ação que, segundo oficiais americanos, pode ter sido inspirada pelo incentivo de Obama a fazer o possível para aliviar a situação.

Oficiais egípcios informados sobre o telefonema disseram que os presidentes não concordaram sobre quem era responsável pela situação em Gaza, mas concordaram que é preciso parar a escalada de tensão.

PRAGMÁTICO

Oficiais israelenses dizem, em particular, que contatos de segurança entre Egito e Israel mantiveram-se desde que Mubarak foi derrubado e mesmo sob o governo de Mursi, ainda que os laços de Israel com Cairo, que nunca foram amigáveis, tenham esfriado mais.

"Ao final, os dois lados devem chegar a um acordo... que seria do interesse de todos", disse um oficial de segurança em Cairo, acrescentando que oficiais egípcios estavam trabalhando para reinstaurar uma trégua rompida ente o Hamas e Israel.

Uma delegação de oficiais da inteligência egípcia encontrou-se com representantes do Hamas em Gaza na sexta-feira, junto com o primeiro-ministro Hisham Kandil.

O porta-voz da Presidência, Yasser Ali, disse que a diplomacia era um dos principais caminhos seguidos pelo Egito para "alcançar uma trégua".

"O Egito está seguindo vários caminhos para acabar com as violações e agressões de Israel em Gaza. À frente, está intensa ação diplomática, envolvendo os países mais eficientes do mundo árabe e além", ele disse.

O Egito tem opções limitadas para além de medidas majoritariamente simbólicas, como retirar seu embaixador de Tel Aviv ou buscar apoio na Liga Árabe, com base no Cairo, onde pode tentar reconstituir sua reputação como uma potência diplomática regional, status que se desfez sob Mubarak.

"Retirar o embaixador é uma medida clássica e simbólica de Mursi para prevenir uma revolta dos islamitas em casa", disse Khalil Anani, analista especializado no Egito, da universidade britânica Durham.

"A trégua que ele está tentando estabelecer mostra que a liderança da Irmandade é realista e pragmática, capaz de deixar de lado sua ideologia para manter uma política externa estável."

Mesmo algumas das vozes mais destacadas entre os simpatizantes da Irmandade pediram cautela dos apoiadores do grupo, ainda que calcados em um endurecimento das conversas para o longo prazo.

"Seja paciente como os companheiros do profeta o foram no seu tempo", disse o pregador Safwat Hegazy, que apoiou a eleição de Mursi, dizendo a seguidores que "nós estamos construindo um estado que precisa de anos e anos de esforço intenso".

"O Exército egípcio não pode interferir na Palestina agora. Não podemos ir a Jerusalém lutar", escreveu no Facebook.

Contudo, o Egito pode ainda ter espaço para pressionar Israel, como ameaçar diminuir as restrições da passagem para Gaza. Até agora, o governo de Mursi mostrou pouco interesse, até mesmo destruindo alguns túneis usados para contrabandear objetos e pessoas, para dentro e para fora do território.

Israel Hasson, ex-vice chefe da segurança interna israelense e legislador do partido Kadima que fez parte de mediações delicadas com o Egito, disse que o país poderia agir sem romper laços.

"Eles poderiam certamente vir e dizer que os acordos que lidam com cruzamento das fronteiras não estão valendo e que estão abrindo as fronteiras e começando a mover coisas em nome de seus irmãos de luta do Hamas", ele disse.

Medhat el Hadad, membro sênior da Irmandade Muçulmana, também indicou que o Egito tentaria agir "sem romper laços".

"Mesmo que ele não possa mudar o rumo das relações agora ele está chamando os líderes mundiais para garantir que Gaza seja uma prioridade para eles também", disse Hadad.

Nos anos Mubarak, o país costumava agir como mediador dos conflitos na região apoiado no tratado de paz com Israel, que usava como ferramenta para falar com todos os lados.

Apesar de o tratado ter mantido a paz por mais de três décadas, muitos egípcios reclamam sobre algumas de suas disposições, incluindo os limites às forças de segurança que o Egito pode enviar à região da fronteira do Sinai.

Durante as eleições presidenciais egípcias, vários políticos, dos islâmicos aos esquerdistas e liberais, sugeriram que o tratado deveria apenas ser modificado, mas alguns disseram que ele deveria ser rasgado.

Mursi raramente fez referência direta a Israel em seus comentários públicos. A Irmandade, da qual ele saiu quando tornou-se presidente, considera Israel um estado racista e expansionista, descrevendo-o em seus documentos públicos como "a entidade sionista".

Mas, com a economia em crise, Mursi tem pouco interesse em distrair-se com o tensionamento das relações com seu vizinho, apesar de ter, agora, que observar com mais atenção essas ligações.

"Ele está tentando evitar a questão Palestina-Israel. Mas agora ele terá que encará-la", disse Anani

 

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