Descrição de chapéu The New York Times

Sob a chefia de Flynn, Conselho de Segurança Nacional viveu dias de caos

DAVID E. SANGER
ERIC SCHMITT
PETER BAKER
DO "NEW YORK TIMES", EM WASHINGTON

São dias de caos e ansiedade no Conselho de Segurança Nacional dos EUA, o tradicional centro de gestão para as relações da Presidência dos Estados Unidos com um mundo inseguro.

Com três semanas de governo deDonald Trump, os membros do conselho se levantam de manhã, leem as postagens do presidente no Twitter e lutam para fazer políticas adequadas a elas.

A maioria fica no escuro sobre o que Trump diz aos líderes estrangeiros em seus telefonemas. Alguns membros da equipe recorreram a comunicações criptografadas para falar com seus colegas, depois de saber que altos assessores de Trump estão considerando um programa de "ameaça interna" que poderá resultar no monitoramento de celulares e e-mails em busca de vazamentos.

O conselheiro de Segurança Nacional, Michael Flynn, foi levado a renunciar nesta segunda-feira (13) após ser investigado sobre uma conversa que manteve em dezembro com o embaixador russo nos EUA sobre uma eventual suspensão das sanções impostas contra a Rússia nos últimos dias do governo Barack Obama.

Apesar de Trump ter sugerido a repórteres na sexta-feira (10) que não sabia das últimas questões que giram em torno das tratativas de Flynn com a Rússia, assessores disseram durante o fim de semana na Flórida –onde Flynn acompanhou o Trump em seu encontro com o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe– que Trump estava monitorando de perto a reação às conversas de Flynn.

O "The New York Times" conversou com mais de 20 membros atuais e passados do conselho e de outras áreas do governo, que relataram a vida no interior do conselho –escritórios formados por centenas de funcionários públicos de carreira que assessoram o presidente sobre contraterrorismo, política externa, dissuasão nuclear e outras questões de guerra e paz.

"Até agora é um conselho muito disfuncional", disse em uma entrevista por telefone o deputado Adam Schiff, da Califórnia, o principal democrata na Comissão de Inteligência da Câmara.

Em uma conversa por telefone no domingo (12), a vice-assessora de Segurança Nacional, K. T. McFarland, disse que as primeiras reuniões do conselho foram mais rápidas, duras e decisivas que no passado, mas reconheceu que os funcionários de carreira estão nervosos.

"Não apenas este é um novo governo, como é de um partido diferente, e Donald Trump foi eleito por pessoas que querem ver a situação atual jogada fora", disse McFarland, uma veterana do governo Reagan que recentemente trabalhou na emissora Fox News.

"Eu acho que seria um erro se não ficássemos consternados com as mudanças –a maior parte do Gabinete nunca esteve no governo antes."

Sempre há um período de revolução para qualquer Conselho de Segurança Nacional, cuja equipe é tirada do Departamento de Estado, do Pentágono e de outros órgãos, e é de modo geral abrigada em frente à Casa Branca, no Edifício de Escritórios Executivos Eisenhower.

O presidente Barack Obama substituiu seu primeiro assessor de Segurança Nacional, o general de quatro estrelas James Jones depois de concluir que ele era inadequado ao governo. Os primeiros anos do conselho do presidente George W. Bush foram definidos por choques entre burocratas experientes –Dick Cheney, Donald Rumsfeld e Colin Powell, entre eles– e por decisões que muitas vezes ocorriam fora dos canais oficiais.

Mas o que está acontecendo sob a Casa Branca de Trump é diferente, dizem autoridades, e não só por causa da política externa de Trump no Twitter –duas autoridades disseram que em uma reunião recente se falou em enviar sugestões de tuítes ao presidente para que a equipe do conselho tivesse maior influência.

Vários membros da equipe que não quiseram trabalhar para Trump voltaram às suas agências regulares, deixando um buraco maior que o normal na burocracia experiente. Muitos dos que continuaram, que se consideram servidores públicos apolíticos, ficaram perturbados por demonstrações de partidarismo declarado.

Em uma reunião geral na segunda semana de governo, aproximadamente, McFarland disse ao grupo que ele precisava "tornar os EUA grandiosos novamente" (o slogan de campanha de Trump), segundo vários membros da equipe que estavam lá.

McFarland muitas vezes usa sua experiência na televisão para deixar claro para as autoridades que elas precisam defender suas teorias nas reuniões do conselho rapidamente, e indica quando devem concluir, disseram vários participantes.

E enquanto Obama gostava de documentos de opções políticas que contivessem de três a seis páginas com espaço simples, os membros do conselho hoje são instruídos a limitar os documentos a uma página, com muitos gráficos e mapas.

"O presidente gosta de mapas", disse uma autoridade.

Flynn se encontra em um conflito constante com as agências de inteligência, cujo trabalho sobre a Rússia e outras questões ele descartou como abaixo da média e politicamente tendencioso.

Na semana passada, em um incidente relatado primeiro pelo site Politico, um dos principais assessores de Flynn, Robin Townley, não recebeu a liberação de segurança de alto nível de que precisava para que pudesse assumir seu cargo no conselho como diretor sênior para a África.

Não ficou claro o que no passado de Townley o desqualificou, e em todos os governos algumas autoridades não recebem a autorização. Mas alguns viram a comunidade de inteligência revidar.

Duas pessoas com acesso direto à liderança da Casa Branca disseram que Flynn ficou surpreso ao saber que o Departamento de Estado e o Congresso têm um papel vital na venda internacional de armas e nas transferências de tecnologia.

Assim, foi uma dura descoberta a de que Trump não poderia simplesmente ordenar que o Pentágono enviasse mais armas à Arábia Saudita –que está clamando pela suspensão da proibição do governo Obama à venda de bombas de fragmentação e armas teleguiadas de precisão– ou entregar pacotes maiores de armas aos Emirados Árabes Unidos.

Vários membros da equipe disseram que Flynn, que foi um oficial de carreira do Exército, não sabia como convocar a Guarda Nacional em uma emergência para, por exemplo, um desastre natural como o furacão Katrina ou a detonação de uma bomba suja em uma cidade americana.

Na reunião geral, Flynn falou sobre a importância de uma vida de trabalho equilibrada, cuidar da família e usar o tempo no conselho para adquirir experiência que ajudaria membros da equipe em outras partes do governo.

A certa altura, o grupo foi solicitado a levantar as mãos para mostrar quantos esperavam estar trabalhando na Casa Branca no próximo ano.

Flynn voltou-se para McFarland e, no que pareceu uma piada autodepreciativa, disse: "Eu me pergunto: será que estarei aqui dentro de um ano?"

Traduzido por LUIZ ROBERTO M. GONÇALVES

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