Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
26/05/2010 - 23h09

Busca por traficante mata 49 na Jamaica; governo não sabe se ele está no país

Publicidade

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A capital da Jamaica, Kingston, chegou ao quarto dia de confrontos com quase 50 mortos e sob suspeita de que as forças do governo abusaram da força ao invadir a favela de Tivoli Gardens na segunda-feira. No entanto, o homem que causou essa onda de violência continua solto e o governo nem sabe informar se ele está, realmente, em solo jamaicano.

Desde domingo, soldados e policiais estão em confronto com supostos apoiadores do narcotraficante Christopher "Dudus" Coke, 42, que as autoridades querem prender para extraditar aos EUA, onde ele é acusado por tráfico de drogas e armas

Ricardo Makyn/AP
Forças de segurança em Kingston prosseguem na busca pelo traficante Coke
Forças de segurança em Kingston prosseguem na busca pelo traficante Coke

Segundo a polícia, nesta quarta-feira o total de mortos chegou a 49. A maioria dos mortos eram jovens de até 30 anos e supostos membros da gangue que apoia Coke. Eles foram mortos quando as forças de segurança fortemente armadas invadiram a favela Tivoli Gardens na segunda-feira (24). Promotores americanos alegam que o local é uma base dos apoiadores de Coke.

A polícia informou que ao menos quatro soldados e policiais foram mortos nos confrontos na capital jamaicana.

As forças de segurança declararam ter dominado a favela nesta quarta-feira, mas os confrontos continuavam em Tivoli Gardens, segundo um porta-voz do governo. Cerca de 500 moradores da favela foram presos. Coke, no entanto, ainda não foi capturado.

"Não poderia dizer se ele está na Jamaica", disse o ministro da Informação, Daryl Vaz. "É muito difícil de saber." O advogado do narcotraficante não quis confirmar seu paradeiro.

Os Estados Unidos reforçou seu total apoio aos esforços do governo jamaicana para deter Coke. "Nós percebemos que é um desafio significativo para as autoridades da Jamaica, mas estamos confiantes de que estão cuidando disso do modo como precisam", disse Arturo Valenzuela, secretário de Estado assistente para assuntos do hemisfério ocidental.

Chacina?

Autoridades do governo disseram a jornalistas que todos os civis mortos eram homens. Mas alguns moradores das favelas disseram a rádios locais que houve tiroteio aleatório durante a invasão da polícia na segunda-feira.

Mark Brown/Efe
Policial coordena o tráfego ao lado de carro capotado em Kingston; total de mortos chega a 49
Policial coordena o tráfego ao lado de carro capotado em Kingston; total de mortos chega a 49

As autoridades jamaicanas podem ser condenadas por grupos internacionais de direitos humanos pelo uso excessivo da força, caso isso venha a ser comprovado. A Anistia Internacional divulgou um relatório nesta quinta-feira que coloca a Jamaica entre os piores infratores na América quando o assunto é assassinato ilícito por forças de segurança.

A Jamaica tem uma das taxas mais altas de assassinato per capita do mundo.

O político Herro Blair disse que, segundo suas contas, 44 civis foram mortos em Tivoli Gardens. Ele foi enviado ao local pelo primeiro-ministro da Jamaica em uma missão de inspeção nesta terça-feira, junto com o defensor público, Earl Witter.

"Nós agora sabemos que com certeza há 35 corpos de civis no necrotério, e quando estávamos saindo, na noite passada, haviam outros nove para serem buscados", disse Blair, que é um bispo evangélico.

Witter disse estar preocupado com a diferença entre o alto número de civis mortos no ataque a Tivoli Gardens e o baixo número de armas apreendidas por soldados e policiais --apenas quatro, incluindo um rifle automático AK-47. "As forças de segurança têm sua própria explicação. Se eles não acham particularmente curioso, eu certamente acho", disse o defensor público.

O premiê prometeu uma investigação independente sobre os mortos durante as operações. Golding disse que "as mais completas investigações" vão examinar todas as mortes causadas pelas forças de segurança, que têm uma reputação de fazer investigações desleixadas e de serem muito rápidas no gatilho.

Muitos moradores, porém, apoiaram a invasão. "Esse país foi tomado por criminosos e tivemos 1.800 assassinatos no ano passado. Tivoli Gardens é um dos piores lugares na Jamaica e é hora de que algo seja feito pela comunidade. É como um reino dentro de uma ilha", disse a moradora Jennifer Baker.

Relações escusas

O premiê Bruce Golding classificou como "ofensivas" algumas reportagens veiculados nos EUA e no Reino Unido ligando ele ao chefe do tráfico, informou o Serviço de Informações Jamaicano.

Políticos jamaicanos e líderes de gangues têm ligações estreitas há décadas. Partidos políticos criaram as gangues de rua jamaicanas nos anos 1970 para angariar votos. Desde então, as gangues tornaram-se traficantes de droga, mas mantêm-se incondicionalmente e, muitas vezes, violentamente fiéis a seus partidos.

A favela liderada por Coke tem sido há muito tempo um bastião de apoio ao governista Partido Trabalhista Jamaicano. Faz parte do distrito representado no Parlamento pelo primeiro-ministro Bruce Golding.

Não se sabe de Golding ter relações pessoais com Coke, mas analistas políticos afirmam que ele não teria sido eleito sem o apoio do chefe do tráfico. Um ex-premiê do mesmo partido, Edward Seaga, participou do funeral do pai de Coke, um líder de gangue conhecido como Jim Brown, que morreu num incêndio na prisão em 1992 quando esperava para ser extraditado aos EUA acusado de tráfico de drogas.

A polícia raramente entra na favela de Coke. A última vez que eles tentaram tomar controle de Tivoli Gardens, em 2001, confrontos deixaram 25 civis mortos, além de um soldado e um policial.

Consequências

A capital da ilha caribenha, que costuma ser uma atração turística, ficaram praticamente desertas, com poucos carros e a maioria das escolas e lojas de portas fechadas. Soldados e policiais faziam patrulhas em veículos armados e veículos esportivos. Tiros podiam ser ouvidos nesta quarta-feira na região de Waltham Park, ao norte de Tivoli Gardens, e de Rockfort, no caminho para o aeroporto internacional de Kingston.

O primeiro-ministro da Jamaica, Bruce Golding, declarou estado de emergência no domingo em dois distritos de Kingston, após supostos apoiadores de Coke atacarem delegacias com tiros e bombas, e disse que a ordem permanece em vigor por um mês.

O governo declarou que o país está em "estado de sítio" sob domínio dos grupos criminosos, e pediu uma resposta dura contra o crime. No passado, esse tipo de medida já prejudicou a imagem da Jamaica como popular destino turístico para americanos e europeus.

Os confrontos dos últimos quatro dias afetaram os voos de e para o aeroporto de Kingston. Também levaram o Departamento de Estado dos EUA a alertar para que os americanos não viajem para a cidade e seus arredores.

Alguns empresários reclamaram de uma queda brusca no turismo, mas autoridades disseram que a violência ainda não teve nenhum impacto na produção de banana, açúcar e bauxita da ilha.

"Dudus" Coke

Moradores dizem que Coke é temido por suas táticas linha-dura, mas que também é conhecido por ajudar moradores das favelas com contas de supermercado, empregos e taxas escolares.

Os EUA pediram a extradição de Coke em agosto do ano passado, mas a Jamaica inicialmente negou o pedido, alegando que as provas contra ele tinham sido reunidas por meio de grampos telefônicos ilegais.

Um pedido de prisão para começar o processo de extradição de Coke foi finalmente divulgado na semana passada.

Ele foi indiciado em Manhattan em 2009 sob acusações de conspiração para o tráfico de drogas e armas, acusações que têm pena máxima de prisão perpétua.

Ele é acusado de manter uma base de contrabando que exporta cocaína e maconha para Nova York e manda armas de volta para a Jamaica. Os EUA indiretamente acusam Coke de ter controlado a comunidade de Tivoli Gardens desde o começo dos anos 1990 como um "forte".

Promotores americanos descreveram Coke como o líder do "Shower Posse", grupo que matou centenas de pessoas a tiros durante as guerras do tráfico de cocaína nos anos 1980.

A onda de violência não surpreendeu a polícia jamaicana e os moradores, que alertaram que Coke estava estocando armas e preparando sua defesa desde que os EUA exigiram sua extradição, no ano passado. Segundo os EUA, ele teria construído um arsenal pessoal de armas infiltradas por membros de sua gangue nos EUA.

"A situação em Tivoli é horrível, mas é algo que foi sendo cozinhado em fogo brando por muito, muito tempo. E todo mundo sabia que se eles fossem atrás de Coke, haveria problema", disse Susan Goffe, porta-voz do grupo local de direitos humanos Jamaicanos pela Justiça.

 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página