Cientistas estudam plataforma de gelo na Antártida com imagem em 'close' das profundezas

Robô submarino ajuda pesquisadores a detalharem o processo de derretimento

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Henry Fountain
The New York Times

Enviando um robô submarino até embaixo de uma plataforma de gelo na Antártida que está derretendo em ritmo acelerado, cientistas descobriram novas pistas sobre como está ocorrendo o derretimento. As descobertas vão ajudá-los a avaliar o risco criado por essa e outras plataformas de gelo para a elevação do nível do oceano no longo prazo.

Os pesquisadores disseram que o derretimento geral da parte inferior de um trecho da plataforma de gelo Thwaites, na Antártida ocidental, é menor do que se previa a partir das estimativas derivadas de modelos computadorizados. Mas também descobriram que o derretimento acelerado está ocorrendo em lugares inesperados: uma série de terraços e fendas que sobem até o gelo.

Sombra de um robô estreito e comprido 'nadando' em águas de cor azul escura, logo abaixo de uma 'mancha' verde clara, que é o gelo
O robô Icefin em ação abaixo do gelo marinho durante sessão de treinamento perto da estação McMurdo, na Antártida - Icefin/Nasa PSTAR Rise Up/Schmidt/Lawrence via NYT

As descobertas não alteram o fato de que Thwaites é uma das plataformas de gelo da Antártida que está recuando mais rapidamente e é menos estável, além de ser uma que das que causa mais preocupação para a elevação do nível do mar. Tampouco muda as previsões de que o desabamento da plataforma e da geleira da qual ela faz parte resultarão numa elevação aproximada de 60 centímetros ao longo de alguns séculos.

Um dos cientistas envolvidos, Peter E. D. Davis, oceanógrafo do British Antarctic Survey (instituto nacional britânico de pesquisas na Antártida), disse que a pesquisa "nos está revelando muito mais sobre os processos que levam ao recuo da Thwaites". Publicadas na quarta-feira no periódico Nature, as descobertas serão usadas para aprimorar modelos que preveem o futuro de longo prazo da Thwaites.

A pesquisa integra um esforço maior, a Colaboração Internacional sobre a Geleira Thwaites, patrocinada pelos EUA e o Reino Unido, para ter um entendimento melhor do que está ocorrendo na Thwaites.

A plataforma de gelo é a língua flutuante da geleira Thwaites, um rio de gelo do tamanho da Flórida que ajuda a manter no lugar uma das duas imensas calotas de gelo da Antártida. As águas em volta da Antártida estão esquentando devido à mudança climática, e quando essa água morna flui por baixo da plataforma de gelo, o gelo derrete por baixo e a plataforma afina.

Robô amarelo na água
Robô Icefin durante estudos na plataforma de gelo Thwaites, na Antártida - Becka Bower/Cornell University/Divulgação via Reuters

A chamada linha de aterramento, a área onde o gelo flutuante encontra o fundo rochoso, vem recuando à medida que a plataforma perde gelo, tendo recuado cerca de 13 km para o interior nas duas últimas décadas.

As novas descobertas constam de dois artigos publicados pela Nature. Davis foi o autor principal de um deles e Britney E. Schmidt, geofísica da Universidade Cornell, do outro.

Os pesquisadores acamparam sobre o gelo durante o verão antártico de 2019-2020, frequentemente sob condições de frio e vento extremos, e usaram água quente para abrir vários furos que atravessaram 610 metros de gelo até chegar ao oceano abaixo, a pouca distância da linha de aterramento.

Davis e sua equipe baixaram instrumentos na água para medir sua temperatura, salinidade e outras características. Descobriram que a água estava substancialmente acima da temperatura de congelamento, mas a correnteza lenta e as camadas de água de diferentes níveis de salinidade impediram uma mistura que poderia ter levado mais calor para cima e derretido mais gelo.

O oceanógrafo Alastair Graham, da universidade de South Florida, que estuda o recuo histórico do gelo da Thwaites mas não participou desses dois estudos, disse que o trabalho da equipe de Davis mostrou que "há bastante calor que está chegando até a zona de aterramento da Thwaites. Mas nem todo esse calor oceânico está se convertendo em derretimento."

Pessoas com casacos laranjas perto de barracas e equipamentos olham para o chão enquanto cavam buraco
Cientistas membros de grupo britânico que estuda a plataforma Thwaites abrem buraco no gelo pelo qual vão passar instrumentos de pesquisa - Icefin/ITGC/Schmidt via The New York Times

O astro da pesquisa foi o robô submarino, chamado Icefin, projetado, construído e operado por Schmidt e sua equipe. Cilindro de 23 cm de diâmetro e cerca de 3,5 metros de comprimento, o robô leva câmeras, sonar e outros instrumentos, além de propulsores. Schmidt o "dirigiu" através de um cabo comprido que transmitiu sinais da superfície.

O Icefin explorou fendas e terraços íngremes no lado inferior do gelo e encontrou derretimento acelerado ali, pelo fato de a orientação quase vertical das paredes laterais da plataforma permitir a mistura de camadas de água, levando mais calor para o gelo.

Em alguns momentos o Icefin permitiu que os pesquisadores medissem o que estava acontecendo a poucos centímetros do gelo. Enxergar de perto aquelas faces do gelo e sua orientação foi confuso, disse Schmidt, e "a tentativa de entender tudo isso vem sendo uma parte importante do trabalho".

Como Davis, Schmidt disse que as descobertas contextualizam o que está ocorrendo na geleira Thwaites. "Não se trata de ‘água morna equivale a uma quantidade x de derretimento’", ela disse. "É ‘água morna mais processo x leva a derretimento."

Pelo fato de que há menos derretimento na parte inferior, mas de a Thwiates ainda assim estar instável, ela disse, "na realidade é necessário muito menos do que pensávamos para causar um desequíbrio".

"Não significa que a situação seja pior", disse Schit. "Significa que é diferente."

Tradução de Clara Allain

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