Biólogos denunciam 'safári' de jacarés em lagoas do Rio

Polícia Civil abriu inquérito para investigar a morte de oito de animais em complexo de Jacarepaguá, na zona oeste

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Rio de Janeiro

Quem passa pelos canais do sistema lagunar de Jacarepaguá, na zona oeste do Rio de Janeiro, e vê abundância de jacarés às margens não imagina a realidade desses animais em todo o complexo de lagoas da região. Especialistas afirmam que a única espécie existente no Sudeste do país, a papo-amarelo, corre o risco de extinção no estado por causa da crescente pesca e caça ilegal.

Desde o início do ano, ao menos oito jacarés foram encontrados mortos sem cabeça, com marcas de tiros ou presos a anzóis. A denúncia foi feita pelos biólogos Mário Moscatelli e Ricardo Freitas Filho. O caso foi registrado na DPMA (Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente), que abriu inquérito para identificar os responsáveis pelas mortes.

Imagem colorida mostra jacaré morto com uma espécie de anzol preso em sua boca
Jacaré morto após ser atingido por garateia, uma espécie de anzol, na lagoa de Jacarepaguá, zona oeste do Rio - Mário Moscatelli/Divulgação

"A situação é muito pior do que parece porque os dados dos animais mortos são subestimados. Muitos, quando feridos, não são encontrados porque se escondem em áreas do manguezal onde não temos condições de circular. Sem contar os que são levados pelos caçadores", afirmou Freitas Filho, fundador do Instituto Jacaré, no Rio.

Uma das hipóteses é a de que os animais, assim como capivaras e caranguejos, estejam sendo caçados para a comercialização.

"Para além do crime ambiental, existe um risco grave à saúde pública no consumo dessa carne. Ela é contaminada porque esses animais têm alto índice de metal pesado concentrado no corpo, principalmente toxinas de cianobactérias, ligadas à presença de esgoto na água. Ou seja, quem come também ingere esses metais", disse.

O especialista, que estuda a espécie há 23 anos na região, explica ainda que isso se deve à degradação ambiental do habitat dos animais.

"Os jacarés que se concentram próximo aos canais estão ali para tirar proveito do lixo descartado, que usam como fonte de alimentação. Mas, a verdade é que temos uma taxa de reprodução cada vez menor. A população de macho, está em 87%, ameaçando recrutamento natural da espécie", afirmou.

Já o biólogo Moscatelli destaca que o crescimento urbano desordenado também impulsiona a morte desses animais.

"Os jacarés também sofrem com a supressão de ecossistemas onde esses animais viviam, alimentavam e reproduziam, e que agora são expulsos pelo crescimento urbano. Ou seja, existe um conjunto de fatores que envolvem o perigo de redução de jacarés além da caça, que a gente costuma dizer que virou um safari", disse.

Após as denúncias, a Secretaria municipal de Ambiente e Clima iniciou uma operação de combate à caça de jacarés e capivaras na região. Durante a ação, na terça (18), os agentes encontraram um cemitério de embarcações abandonadas e escondidas sob a vegetação de mangue.

"Nosso trabalho, inicialmente, foi de informar a população que a prática de captura ou matança de jacarés, capivaras ou qualquer outro animal silvestre é crime, porém em caso de flagrante, o infrator será preso pela lei de crimes ambientais", disse a secretária Tainá de Paula.

As autoridades também apuram denúncias de ocupação irregular de áreas de proteção ambiental às margens da lagoa da Tijuca.

De acordo com os biólogos, o desaparecimento total dos jacarés ameaça a existência de outras espécies e aumenta a proliferação de pragas.

"O jacaré o predador de toda a cadeia, que mantém a regulação de toda a população e o equilíbrio ecológico dentro do complexo lagunar de Jacarepaguá que é a maior referência da cidade de habitat natural onde a espécie ainda existe e persiste sobrevivendo a condições bem precárias como tem sido nos últimos anos", afirmou Freitas Filho.

Outra denúncia de Moscatelli é a respeito da captura de caranguejos na região com uso de laço —uma técnica "condenável", segundo o especialista.

"São armadilhas compostas por um pedaço de madeira com fitilhos que as pessoas colocam dentro dos buracos dos caranguejos, que se enroscam no material. A técnica acaba pegando fêmeas e filhotes, ameaçando as próximas gerações. Além disso, a grande maioria dos animais é morta e abandonada pelos instaladores que acabam esquecendo onde colocaram as armadilhas", relatou.

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