Mudança climática transforma neve em chuva e eleva risco de deslizamento de montanhas

Novo estudo aponta que para cada 1°C que o planeta aquece, áreas mais elevadas terão 15% mais chuvas fortes

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Delger Erdenesanaa
The New York Times

À medida que o clima global esquenta, as regiões montanhosas terão mais chuvas de grande intensidade do que se pensava anteriormente, e mais dos perigos que vêm com elas, segundo um estudo publicado na quarta-feira (28) na revista Nature.

Embora os cientistas tenham estudado como a mudança climática poderá aumentar as chuvas extremas em geral, até agora eles não haviam distinguido quanto da precipitação mais forte cairá como neve e quanto como chuva. A distinção é importante porque a chuva tende a produzir mais riscos para os seres humanos do que a neve, incluindo inundações, deslizamentos de terra e erosão do solo.

À medida que o planeta esquenta, a neve começa a se transformar em chuva, mesmo nas montanhas. O estudo descobriu que para cada 1°C que o planeta aquece, as áreas mais elevadas podem esperar 15% mais chuvas fortes.

Montanha coberta de neve; à frente há uma planície seca, de cor amarelada
Montanha coberta de neve perto do lago Zonag em Hoh Xil, no noroeste da China - Pan Binbin - 20.jun.2023/Xinhua

"Esta é a primeira vez que isso foi quantificado", disse o principal autor do estudo, Mohammed Ombadi, cientista de dados ambientais do Laboratório Nacional Lawrence Berkeley, nos Estados Unidos.

Esse aumento da precipitação extrema é "quase o dobro" do aumento da precipitação extrema total, incluindo chuva e neve, que os cientistas climáticos esperavam anteriormente. A descoberta sobre as precipitações se aplica apenas às regiões mais elevadas do mundo, acima de aproximadamente 2.000 metros de altitude.

Mas cerca de um quarto da população humana vive em regiões montanhosas ou diretamente a jusante (abaixo) delas, disse Ombadi. Embora os deslizamentos de terra não cheguem muito longe, as inundações tendem a afetar mais as populações a jusante, explicou ele, acrescentando que a precipitação é um dos fatores mais importantes na previsão dos riscos de ambos os perigos.

A erosão do solo pode prejudicar fazendas e ecossistemas naturais e aumentar ainda mais os riscos de inundações e deslizamentos de terra. Essas ameaças se somam àquelas representadas pelo derretimento das geleiras nas mesmas cadeias de montanhas e vales fluviais.

Frances Davenport, professora de engenharia civil e ambiental da Universidade Estadual do Colorado, que não participou do estudo, confirmou que, embora os pesquisadores tenham examinado separadamente como a precipitação extrema está aumentando e como a queda de neve está se transformando em chuva, poucas pesquisas combinaram esses fatores até este novo estudo.

"É uma boa maneira de juntar essas mudanças e destacar as regiões onde devemos estar particularmente atentos para grandes mudanças no risco de inundação e chuvas extremas", disse Davenport.

Em seu estudo, Ombadi e seus colegas analisaram dados históricos de 1950 a 2019, bem como projeções de mudanças climáticas até o final do século 21. Eles se concentraram nas regiões temperadas e árticas do hemisfério norte porque faltam dados sobre os trópicos e o hemisfério sul.

Ao modelar diferentes cenários de aquecimento global, os pesquisadores descobriram que as chuvas extremas continuaram aumentando de forma constante, na mesma taxa, para cada grau de aquecimento.

"Se você tem 1°C de aquecimento, isso representa um aumento de 15%. Se for de 3°C, haverá um aumento de 45% na precipitação", explicou Ombadi.

Isso foi uma surpresa, pois a equipe esperava que o aumento das chuvas diminuísse e se estabilizasse à medida que as temperaturas subissem cada vez mais. Eles usaram vários modelos climáticos diferentes, com resultados relativamente consistentes entre eles.

"A grande mensagem é que todos os graus são importantes", disse Ombadi. Ele alertou, no entanto, que os modelos climáticos ainda são um tanto imprecisos em temperaturas mais extremas.

Os pesquisadores também descobriram que quanto maior a elevação maior o aumento das chuvas extremas. Ao contrário da mudança que acompanhou o aumento das temperaturas, essa mudança não foi linear: quanto mais alto eles olhavam, mais notavam o aumento das chuvas.

Diferentes cadeias de montanhas ao redor do hemisfério norte também tiveram riscos ligeiramente diferentes de chuvas de grande intensidade. Os pesquisadores ainda estão tentando descobrir por quê.

O número de deslizamentos de terra mortais em todo o mundo aumentou nas últimas décadas, conforme outro estudo de 2019. A maioria desses deslizamentos aconteceu em locais expostos a chuvas extremas.

As áreas de maior risco neste estudo de deslizamento de terra mais antigo correspondem às áreas de maior risco no novo estudo de precipitação, disse Ubydul Haque, pesquisador geoespacial de saúde pública da Universidade Rutgers e principal autor do artigo de 2019.

Haque ficou impressionado com a escala dos dados usados pela equipe do Lawrence Berkeley. A abordagem deles é "extremamente nova", disse ele. Para Haque, as descobertas do novo estudo e os dados subjacentes poderão ser úteis em futuras pesquisas sobre as implicações de chuvas extremas para a saúde e a segurança.

Ombadi, que tem formação em engenharia civil, espera que as descobertas de sua equipe ajudem a melhorar os modelos de avaliação de risco de deslizamentos de terra e inundações e propiciem um melhor planejamento e infraestrutura em locais vulneráveis a esses perigos. A pesquisa também pode ser útil para melhorar os modelos climáticos com que os pesquisadores contam para prever alterações de longo prazo nas chuvas.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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