Temperatura recorde nos oceanos coloca vida marinha em zona de perigo, diz novo relatório

Pico de calor das águas neste ano foi de 21,1°C, o que ultrapassa marca de 2016

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Martha Muir
Financial Times

A biodiversidade marinha está ameaçada devido às temperaturas recordes da superfície do mar em nível global e às ondas de calor marinhas mais frequentes em zonas inesperadas, conforme constatado no mais recente relatório dos oceanos da agência europeia de observação da Terra.

As temperaturas médias da superfície do mar atingiram 21,1°C em abril, e grandes áreas experimentaram "ondas de calor intensas" de junho a agosto. O relatório do serviço Copernicus afirma que o recorde anterior foi de 21°C, registrados em 2016.

As ondas de calor marinhas se tornaram mais frequentes em todos os lugares, exceto no oceano Austral, com sua ocorrência aumentando em um evento adicional a cada cinco a dez anos, mostra a pesquisa. Por outro lado, os períodos de frio marinho foram reduzidos em um evento a cada cinco anos.

Foto feita embaixo d'água mostra peixes nadando em uma água cor de azul, com raios de sol entrando a partir do alto
Cardumes nadam perto de recife de coral em Key West, ilha que integra a região de Florida Keys (EUA); água nesta área registra temperaturas altas - Joseph Prezioso - 14.jul.2023/AFP

"Não é apenas a frequência", disse Daniela Schmidt, da Universidade de Bristol. "Ondas de calor marinho já ocorreram antes, mas teriam sido isoladas na costa oeste da Austrália, Alasca ou Mediterrâneo. Agora, elas estão acontecendo em áreas que não esperávamos, como ao redor das Ilhas Britânicas."

As ondas de calor marinhas são definidas como eventos temporários em locais específicos onde a água está excepcionalmente quente por um mínimo de cinco dias consecutivos.

"O que está claro é que cada aumento no aquecimento global afetará os extremos climáticos, incluindo o oceano", disse Karina Von Schuckmann, presidente do relatório do estado oceânico no Copernicus. "O que é necessária é a mitigação por meio da redução das emissões, para trazer a Terra de volta ao seu equilíbrio energético."

As ondas de calor marinhas representam uma ameaça para uma ampla variedade de espécies, incluindo corais, ervas marinhas, peixes e aves. Elas também podem causar o branqueamento de corais, alterações nas comunidades de peixes e deterioração das estruturas físicas dos recifes. Os efeitos nos hábitats naturais marinhos e nas cadeias alimentares podem ter consequências adicionais para toda a cadeia alimentar.

No nordeste do Atlântico, onde o Copernicus detectou ondas de calor moderadas a fortes e até extremas, houve uma diminuição de 50% a 60% nas concentrações de fitoplâncton em comparação com o período de 1998 a 2018.

"Os impactos que estamos presenciando são enormes e se propagam por toda a cadeia alimentar", disse Katie Smith, da Associação Biológica Marinha. Por exemplo, a diminuição do plâncton poderia significar que peixes que habitam o fundo do mar e, por sua vez, peixes maiores, como o bacalhau, que se alimentam deles, não encontrariam comida suficiente, colocando em risco o abastecimento de alimentos e as indústrias pesqueiras.

No norte tropical do Atlântico, uma onda de calor moderada a severa cobriu toda a bacia a partir de julho, enquanto houve ondas de calor moderadas a extremas em todo o Mediterrâneo em junho, julho e agosto.
Ondas de calor moderadas a fortes foram observadas no nordeste do Pacífico durante julho, agosto e setembro, e as temperaturas da superfície do mar aumentaram no mesmo período no Pacífico tropical devido às condições do El Niño.

O gelo marinho também está diminuindo rapidamente. O gelo marinho da Antártida atingiu seus níveis mais baixos em maio e junho desde o início dos registros, perdendo uma área sete vezes maior que a da Polônia. O gelo marinho do Ártico perdeu 3,5 milhões de quilômetros quadrados desde 1979, uma área sete vezes maior que a da Espanha.

O gelo marinho ajuda a resfriar a Terra e fornece hábitat para o krill e para microorganismos, além de servir como local para animais maiores, como baleias, encontrarem alimento.

"O albedo da Terra, sua capacidade de refletir a luz solar, é fortemente influenciado pela extensão da cobertura de gelo no planeta", disse Clément Bricaud, oceanógrafo da Mercator Ocean International. "Essa redução dramática do gelo marinho polar no Ártico e na Antártida intensifica o aquecimento global e ameaça abalar ecossistemas frágeis e impactar padrões climáticos em todo o mundo."

Novas pesquisas publicadas esta semana na revista Nature sugeriram que a humanidade ultrapassou um ponto de virada para evitar a instabilidade na camada de gelo da Antártida Ocidental, e que ela continuará a derreter nas próximas décadas e séculos em todos os cenários, acelerando a elevação do nível do mar e modificando as correntes oceânicas que regulam o clima global.

Alberto Naveira Garabato, professor de oceanografia física na Universidade de Southampton, disse que esse é "um estudo preocupante".

"Ilustra como nossas escolhas passadas provavelmente nos comprometeram com um derretimento substancial da camada de gelo da Antártida Ocidental e sua consequente elevação do nível do mar —à qual inevitavelmente teremos que nos adaptar como sociedade ao longo das próximas décadas e séculos."

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