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Escritor e roteirista, autor de "Por quem as panelas batem"

Descrição de chapéu feminicídio

Bolsonarismo

No mundo real, esta crônica terminaria com um duplo feminicídio

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Irene volta pra casa mais cedo e pega o marido na cama com outra. “Arnaldo!”. O homem não se abala. “Que foi?!”. “Como, que foi?! Você aí na cama com uma mulher!”. “Essa é a sua opinião”. “Que?! Não tem opinião sobre isso!”. “Ah, você pode ter a sua opinião e eu não posso ter a minha?! Sabe como chama isso? Comunismo! Vai pra Cuba!”. “Arnaldo! Você tá pelado na cama com uma mulher pelada! Você tá aqui ou não tá, minha filha?!”. A amante balbucia: “Tô”.

O marido capota, mas não breca: “Em quem você vai confiar? Ahn? Na minha palavra? Eu, seu esposo?! Pai dos seus filhos?! Ou na palavra de uma vagabunda que você nunca viu na vida e tá na cama com o seu marido?!”. “Arnaldo! Seu argumento não faz nenhum sentido! Pra que a fala dela seja invalidada por suposta ‘vagabundagem’, é necessário que ela esteja aqui transando com você! E outra! Eu não sei se ela é ou não é uma vagabunda! Nem sei o que isso significa! Sei é que você jurou fidelidade a mim diante de Deus e tá mentindo!”.

“Péra, péra, péra! Não sabe se ela é ou não uma vagabunda?! Então uma mulher que topa fazer sexo com um homem casado não é uma vagabunda?! Que isso?! Aí eu já começo a ficar desconfiado de você...”. “De mim???”. “É. Defendendo vagabunda?! Defendendo mulher que sai por aí dando pra todo mundo... Que história é essa?! Você sai por aí dando pra todo mundo, Irene?! Você tá me traindo?!”. “Chega! Não aguento mais essa conversa absurda! Acabou, Arnaldo!”.

“Você quer destruir a nossa família, Irene!”. “Eu?!”. “Você! Vem pra casa numa hora que não tava combinada, me acusa de traição, faz um barraco! Isso é coisa de comunista! De globalista! De gayzista! Você é lésbica, Irene?!”.

“Que que cê tá falando?!”. “Ué?! Que que cê tá fazendo no nosso quarto com uma mulher pelada?!”. “Eu cheguei aqui e você tava no quarto com uma mulher pelada!!!”. “Não muda de assunto! Não tô falando de antes! Tô falando de agora! Me explica! O que você e essa mulher pelada estão fazendo aqui no nosso quarto?!”. “Ela tava dando pra você! Eu tô brigando com você!”. “Ah, entendi! É um complô! Eu fui vítima de um complô feminista! As duas tão juntas, querendo me destruir! Eu achei que você queria acabar com o nosso casamento, Irene, mas é pior! Vocês armaram tudo isso pra me destruir como homem! O plano de vocês com esse mimimi é emascular todos os homens!”.

Neste ponto, a amante intervém: “Cala a boca, Arnaldo! Olha, Irene, eu tô arrasada. Nem sei o que dizer. Eu sabia que ele era casado? Sabia. Mas a gente não se conhecia, eu tava a fim de curtir e...”. “Ó lá! Papo de vagabunda! As duas se engraçando! Querem que eu saia?! Querem ficar mais à vontade? Por favor!”.

Irene: “Olha, eu nunca tinha pensado nisso, Arnaldo, mas na verdade ela é bem gata. Como você chama, amiga?”. “Amanda. Também te curti.”. Irene: “Dá licença, Arnaldo?”. “Que... Que que cê tá falando?”. “Que você deu duas ideias geniais. Sexo fora do casamento e sexo com alguém do mesmo sexo. Sai, por favor?”. Arnaldo começa a chorar. “Não! Por favor! Irene, eu te amo! Irene! Não faz isso comigo! Eu errei! Foi sem querer!”. A amante: “Arnaldo, vaza!”. Ele tenta segurar o choro. “Posso participar?”. As duas: “Não!”. “Posso só olhar, então?”. “Não!”.

No mundo real esta crônica terminaria com um duplo feminicídio, sem o choro anterior. Felizmente, neste pequeno retângulo, sou rei: em meu modesto reino as duas transam, gozam, conversam, trocam telefones e prometem se afastar do Arnaldo para sempre.

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