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Presidente do Instituto Igarapé, membro do Conselho de Alto Nível sobre Multilateralismo Eficaz, do Secretário-Geral. da ONU, e mestre em estudos internacionais pela Universidade de Uppsala (Suécia)

Descrição de chapéu vale do javari yanomami

Para vencer a crise do ouro ilegal

Brasil precisa começar parceria internacional pelos vizinhos

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A urgência da crise humanitária na TI (Terra Indígena) Yanomami trouxe à tona a problemática do ouro ilegal. Nas últimas semanas, entre outras ações, houve visita de comitiva presidencial e interministerial às regiões mais afetadas, decreto do Ministério da Justiça criando Grupo de Trabalho Interministerial e pedido do STF de abertura de investigação sobre possível participação de autoridades do governo anterior na prática de crimes, incluindo o de genocídio, contra comunidades indígenas.

O assunto também chegou ao debate público. Para além do drama dos povos indígenas, temas técnicos ganham força. Espera-se que em breve se corrijam falhas da legislação sobre o garimpo, gargalos no modelo de comercialização do ouro —vulnerável à lavagem do próprio mineral e também ao lucro advindo da exploração ilegal na Amazônia—, assim como deficiências no sistema de controle e fiscalização por parte da ANM (Agência Nacional de Mineração), Receita Federal e Bacen (Banco Central).

Agentes do Ibama abordam balsa de garimpo ilegal no rio Uraricoera, na Terra Indigena Yanomami - Lalo de Almeida - 11.fev.23/Folhapress

Para tal é urgente uma efetiva coordenação interinstitucional. Cabe à Receita reformar a normativa das notas fiscais ainda em papel, ao Congresso e à ANM aprimorar e efetivar o controle sobre minas em regime de Permissão de Lavra Garimpeira, ao Bacen regular a atividade das DTVMs (Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários) —e analisar a adoção por estas de ferramentas como o PCRO (Procedimento Responsável de Compra do Ouro), desenvolvido pela USP, com apoio do Instituto Igarapé, e ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) incorporar medidas específicas para prevenir lavagem advinda do setor minerário.

Mas é preciso ir além. Para que soluções sejam sustentadas no longo prazo, é necessária uma visão sistêmica que inclua outros pontos fundamentais.

Primeiro, apesar de o garimpo do ouro ilegal atingir o coração da TI Yanomami, esse problema afeta inúmeras outras TIs. Uma ação coordenada do Estado brasileiro deve pensar uma solução para todas elas, não apenas para que se cumpra a lei e se proteja os povos indígenas, mas também por que, como em qualquer mercado dinâmico, a repressão em Roraima ocasiona migração de garimpeiros para estados como o Amazonas e o Pará ou para países vizinhos como Venezuela e Guiana.

Uma solução definitiva para essa questão passa por separar os agentes criminosos que financiam e coordenam com sofisticação e cada vez mais violência de parte dos garimpeiros que praticam a atividade ilegal como forma de subsistência.

Para os primeiros, a lei precisa ser aplicada com rigor. Para os últimos, há de se ofertar alternativas de inclusão socioeconômica.

O segundo ponto é justamente a dimensão regional, ou transfronteiriça. A cadeia produtiva do ouro é de alcance transnacional. Hoje o sistema do Brasil é tão vulnerável que o país também integra (ou "lava") ouro extraído nos países vizinhos, como Colômbia, Guiana, Peru e Venezuela.

Ainda pior, lava também lucros de outras economias ilícitas de organizações criminosas nacionais e da região.

O Brasil precisa cooperar com parceiros internacionais, começando pelos vizinhos com quem compartilhamos a Amazônia, fortalecendo a organização regional que existe para esse fim —a OTCA (Organização do Tratado de Cooperação Amazônica). De forma inteligente, é urgente fiscalizar as fronteiras porosas e a circulação do ouro e outras mercadorias ilegais.

O terceiro é a tendência de empurra-empurra das diferentes autoridades e setores envolvidos de responsabilizar a outros atores pelos problemas, e não a si mesmos. Há muitos atores na cadeia do ouro ilegal: produtores, compradores, financiadores, reguladores, fiscalizadores e consumidores finais.

Todos precisam estar imbuídos do senso de urgência para cobrar e adotar reformas, de curto e médio prazo, para fechar as brechas deste perverso sistema. Há tarefas para todos.

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