Ilona Szabó de Carvalho

Presidente do Instituto Igarapé, membro do Conselho de Alto Nível sobre Multilateralismo Eficaz, do Secretário-Geral. da ONU, e mestre em estudos internacionais pela Universidade de Uppsala (Suécia)

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Ilona Szabó de Carvalho

Amazônia como solução

No vazio institucional instaurado, a violência se fortaleceu como método de resolução de conflitos

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Escrevo esta coluna muito abalada pelo desaparecimento do jornalista Dom Phillips e do indigenista Bruno Araújo. Enquanto aguardamos o desfecho do que aparenta ser um crime brutal que precisa ser esclarecido, devidamente julgado e punido, me pus a refletir sobre como estancar a sangria predatória de recursos naturais e a violência crescente que ocorre na região. Não podemos mais permitir que os defensores da floresta e os que os apoiam assumam com seus próprios meios e corpos a defesa dos seus territórios e do seu modo de vida.

A Amazônia é um ativo estratégico central para nosso país. Para protegê-la é necessário, por um lado, atuar nas múltiplas dimensões de segurança —humana, pública, ambiental e jurídica—, para garantir o cumprimento da lei e a proteção da floresta e seus defensores. Isso envolve um arranjo de governança com diferentes instituições e níveis de governo, com metas comuns e competências de atuação transparentes e colaborativas. E por outro, atrair investimentos alinhados ao desenvolvimento sustentável da região, que tenham a melhoria das condições de vida das populações locais como condição central. Essas duas frentes precisam andar juntas e de forma coordenada.

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Região do Vale do Javari, onde desapareceram Bruno e Dom - Pedro Ladeira - 10 .jun.22/Folhapress

Para que essa visão seja implementada, os planos para a região devem partir de diagnósticos corretos. A começar pelo fato de que existem múltiplas Amazônias, com diferentes populações com distintas vocações e necessidades, incluindo povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas, assentados, população urbana, empreendedores e empresários, mão de obra migrante e refugiados. Há também diferentes regimes fundiários que precisam ser organizados e consolidados, e um paradigma histórico de ocupação violenta que precisa ser transformado.

As sinalizações feitas nos últimos anos pelo governo federal e pelo Congresso Nacional de incentivo e licença social para práticas criminosas contrárias ao meio ambiente e aos direitos humanos, somadas ao desmonte das instituições responsáveis por combater os ilícitos ambientais e proteger as populações tradicionais, agravaram sobremaneira as tensões na região. No vazio institucional instaurado, a violência se fortaleceu como método de resolução de conflitos.

Reconstruir e fortalecer a capacidade de atuação das instituições de fiscalização ambiental e as forças de segurança é primordial. O recado precisa ser claro: armas, violência e corrupção não serão toleradas. A repressão ao crime violento, ao crime ambiental e aos sérios desvios de conduta e crimes cometidos por agentes públicos precisam ser o ponto de partida. E deve ser acompanhada por investigações sobre lavagem de dinheiro que não permitam que o capital irresponsável financie as economias ilícitas e que enfraqueçam as organizações criminosas que hoje avançam sobre as riquezas da floresta.

Para isso é preciso também vencer a falsa dicotomia entre desenvolvimento sustentável e proteção da floresta. Há inúmeras soluções de desenvolvimento compatíveis com a floresta de pé e com a melhoria da vida da população local. Não se pode deixar que o custo reputacional e os riscos de investimento na região desincentivem o capital responsável. Isso só deixa o terreno mais fértil para as economias ilícitas que hoje reinam na região.

Com a Amazônia, o Brasil tem o potencial de desenvolver mercados verdes de primeira linha, como o de carbono, de ser um destino prioritário para o turismo sustentável, de ver florescer cadeias produtivas de bioeconomia e de desenvolver pesquisas e inovações na área de ciências biológicas, naturais e biotecnologia que garantam a inclusão do país na economia do futuro.

Em suma, é urgente que a Amazônia ganhe centralidade em um novo projeto de país. Priorizá-la do jeito certo é o único caminho para a superação dos desafios presentes e futuros. Por todos nós, por Bruno e por Dom, acreditem, a Amazônia é solução.

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