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É publicitária, escritora e produtora de conteúdo. Autora de "E Se Eu Parasse de Comprar? O Ano Que Fiquei Fora da Moda". Escreve sobre moda, consumo consciente e maternidade

Descrição de chapéu Todas Natal maternidade

Como finalmente fiz as pazes com o Natal

Num mundo tão cheio de indiferença e desencantos, a maternidade me fez abrir os olhos para o tanto de magia que pode existir no Natal

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Natal nunca foi o meu rolê. E claro que minha falta de simpatia pela celebração do nascimento de Cristo tem suas origens na minha infância (como presumo que tenham 99% das coisas que sou). Venho de uma família relativamente grande, mas muito dispersa, com gente espalhada aqui e acolá pelo Brasil e pelo mundo. Meus pais, especificamente, não eram dos mais adeptos às festividades de dezembro e se identificavam muito pouco com as tradições e ritos típicos da época.

Nossa tradição, portanto, consistia em invadir as tradições alheias, penetrar festas de famílias de amigos, especialmente de amigos expatriados como minha mãe.

Não lembro de tanta coisa assim. Lembro de não amar a comida, lembro de não amar a função. Lembro que nunca tinha muita criança e que, portanto, nunca era tão divertido. Lembro, sim, de um ano em que a árvore de Natal pegou fogo. Tratava-se de um pinheiro de verdade decorado com velas, também de verdade, receita perfeita para o desastre. Felizmente, fora a árvore, não houve feridos.

Bola de Natal do rei Charles III na árvore da 10 Downing Street, em Londres - Hollie Adams/Reuters

Sim, havia também os presentes, e não subestimemos o poder dos presentes na formação das memórias afetivas das crianças. Mas, honestamente, havia outras ocasiões ao longo do ano igualmente marcadas por presentes e que vinham acompanhadas de celebrações muito mais interessantes, com mais crianças e menos arroz com passas.

Cresci e carreguei a falta de apego pelo Natal para minha juventude, desdenhando da data, fazendo coro aos haters natalinos, reclamando das ruas lotadas, das trilhas sonoras repetitivas e do significado demasiadamente comercial que a data havia ganhado. Me tornei a pessoa que foge do Natal e encontrei paz utilizando a época festiva para me isolar em paraísos que, uma semana depois, se tornavam impraticáveis devido à inflação do Réveillon.

Eis que o tempo passa e chegamos em 2023. Mais precisamente no primeiro dia de dezembro de 2023, o dia em que acordei, me cobri de vermelho e verde dos pés à cabeça e enfrentei o frio londrino de -1ºC para comprar uma árvore de Natal.

Esse cavalo de pau da minha relação com o Natal não aconteceu de uma hora pra outra. Trata-se do fruto amadurecido da semente plantada quatro anos atrás quando eu ganhei o presente que mudaria minha vida para sempre. Naquele 25 de dezembro de 2019, o primeiro que passei com um bebê em meus braços, não pude fugir. O novo membro da família me compelia a estar em família. Pegamos um avião e, pela primeira vez em décadas, segui rumo ao Natal, mais precisamente o Natal na casa da minha sogra.

Não foi fácil. Meu corpo havia criado uma intolerância tão forte ao Natal que por dois dias botei para fora tudo o que ousei botar para dentro. Nem as rabanadas, meu ponto fraco do menu festivo, foram capazes de permanecer dentro de mim. Mesmo assim, pálida e sem energia, incapaz de desfrutar de uma rabanada sequer, foi ali, vendo os olhos de uma bebê de 8 meses brilharem com as luzes que enfeitavam o pinheiro de plástico, que vi amolecerem partes do meu coração que há muito haviam sido congeladas.

A verdade é que desde que tive meus filhos, revoguei de mim o direito de ser blasé sobre qualquer coisa. E num mundo tão cheio de indiferença e desencantos, a maternidade me fez abrir os olhos para o tanto de magia que pode, sim, existir no Natal. Uma magia que mora longe da rigidez das tradições, do constrangimento das obrigatoriedades, do vazio do materialismo. Mas que é abundante na sutileza, na escolha, na simplicidade, no amor. E, com sorte, daqui a muitos anos, quando meus filhos lembrarem dos nossos Natais, é essa magia que preencherá suas memórias.

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