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Engenheiro e jornalista, foi repórter, correspondente, editor e secretário de Redação na Folha, onde trabalha desde 1991. É ombudsman

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A insustentável leveza do Google

Gigante da tecnologia nega seus próprios argumentos ao manipular noticiário

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Os coloridos escritórios do Google em São Paulo ficam na Faria Lima, avenida símbolo do universo financeiro do país que dispensa apresentações. Se é fácil imaginar o estereótipo de um farialimer e suas pretensões sociais e políticas, a gigante de tecnologia parece não caber direito no figurino da região. A turma se esforça nas bicicletas e patinetes na tentativa de emular um Vale do Silício, mas a ciclovia em algum ponto acaba. Na borda dessa terra plana, resta a megalópole infartada.

O Google está na Faria Lima, montado em um mastodonte de vidro, talvez porque em outra região da cidade sua modernidade, o latte do intervalo e os pufes no jardim não funcionariam. Ou, pior, ofenderiam.

Trabalhar na zona de conforto é desejo de qualquer empresa. Na semana passada, o Google mostrou que não vê limites na empreitada para se manter nela. Reportagem da Folha mostrou que, na véspera da votação do PL 2630, que aperta a regulação das redes sociais, o buscador usado por 97% da população dava ampla visibilidade para uma espécie de editorial de seu próprio blog, com críticas à iniciativa.

Também de acordo com o texto, o NetLab da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) constatou que links de conteúdo de oposição ao projeto recebiam tratamento privilegiado nas buscas. O Google nega, mas parece evidente que seu sistema impulsionou um noticiário que o favorecia. É grave o ocorrido, e aqui a discussão não é o teor do projeto, seus defeitos ou virtudes.

Basta mudar o objeto de disputa para entender o tamanho do problema. Hoje é uma legislação que afeta a empresa, amanhã pode ser um candidato. A empresa tem o direito e o dever de se manifestar na discussão de uma lei que mira seu funcionamento, mas não pode interferir no fluxo da comunicação, manipular o noticiário e até mesmo o Congresso.

O Google também não é um veículo de imprensa. Fosse, seria responsabilizado pelo que faz ou deixa de fazer, como acontece com este jornal. Aliás, é exatamente o que não quer ser ao combater o projeto. A Folha tem responsabilidade legal por centenas de jornalistas e isso demanda controle, profissionalismo. As redes sociais não querem o ônus de controlar milhões de pseudojornalistas. Não podem, então, ter o bônus de publicar editoriais como se isso fosse conteúdo jornalístico regular.

É inegável que o 8 de Janeiro e a onda de atos violentos em escolas gerou o açodamento do debate. É difícil discordar também da avaliação de que o projeto abraça frentes em demasia. Nada disso, porém, diminui a urgência de uma internet menos faroeste.

Das tantas opiniões colhidas nos últimos dias pela imprensa, uma das mais sensatas foi publicada em reportagem do Valor Econômico. Ao comentar que o STF provavelmente vai agir se o Congresso não votar a nova legislação, Ricardo Campos, da Universidade de Frankfurt, vaticinou outra possibilidade: "Se esse projeto de lei não passar agora, daqui a dois anos teremos um texto ainda mais duro em discussão no Congresso. Para isso, só precisa de uma nova crise como a do massacre nas escolas ou a do 8 de Janeiro". O Google pode quase tudo, mas garantir que isso não acontecerá de novo é como acreditar que o mundo da Faria Lima é redondo e não acaba na esquina.

Artigo 19

Há um trecho específico do Marco Civil da Internet que afasta das redes sociais a possibilidade de serem responsabilizadas pelo conteúdo de seus usuários. A regra, segundo alguns fundamental para a neutralidade da internet, salvaguarda redes sociais nos EUA, mas é debatida na Suprema Corte do país e ponderada em legislações atualizadas, como no caso da União Europeia.

A discussão se dá também no Brasil. Duas ações no STF contestam a constitucionalidade da regra e repousam na caixa de ferramentas dos ministros. A última semana mostrou que ela está se abrindo com facilidade. Ao fim e ao cabo, as redes sociais serão reguladas.

Agro tóxico

A Folha pôs Jair Bolsonaro na Agrishow na Primeira Página, mas não deu que a Cargill, gigante americana do agronegócio, foi denunciada na OCDE por falhas na due diligence socioambiental de sua cadeia de soja brasileira. Quem patrocina a ação é a ClientEarth, entidade de direito ambiental que processa governos e empresas. Seu caso mais barulhento no momento é contra diretores da Shell. Quer responsabilizá-los individualmente pelo não avanço da companhia na transição energética.

A nova legislação antidesmatamento da Europa alimentará a ofensiva contra a ala selvagem do setor no Brasil. O jornal precisa tirar a bancada ruralista da zona de conforto.

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