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Jornalista, crítico gastronômico, curador de conteúdo e apresentador do canal de TV Sabor & Arte

Visitar as oliveiras de Portugal é viajar pela história do país

É possível conhecer métodos milenares de produção de azeite ou visitar instalações high-tech

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O viajante profissional, ao menos o do meu tipo, pode ter a vantagem de conhecer novos lugares a cada rota obrigatória, emulando a imaginação com destinos imprevistos e recompensadores.

Mas também tem uma dolorosa desvantagem: quase nunca tem a oportunidade de voltar aos lugares que mais o encantaram, nem sequer pode brincar de fincar raízes, ainda que mínimas, tímidas, apenas simbólicas, ali por onde passou.

Às vezes consigo. Como agora que, convidado pelo Cepaal (Centro de Estudos e Promoção do Azeite do Alentejo), voltei ao centro-sul de Portugal para visitar a importante produção de azeite de oliva daquela região. Aqui me tens de regresso!

A simples expectativa de chegar a Évora, cujo centro histórico intramuros me comove (muralhas construídas, imagine, no século 3°), já ameaça compensar o cansaço, a confusão horária, a correria de uma viagem de apenas três dias para além-mar.

Mas chegando lá, pela janela do carro, há que sorver com olhos e narinas os campos do Alentejo.

Vetustos sobreiros desfilam assanhados com suas saias arregaçadas (as partes de baixo dos troncos, descascadas de sua cortiça, parecem alvas intimidades das mulheres de beeeem antigamente, dignas de um show de cancã).

Sua passagem é assistida por cegonhas preguiçosas num voo titubeante, ou paradas no descanso sobre altas estacas e postes, enquanto na tela/janela do carro passam verdes figos da índia, negros porcos ibéricos refugiados na sombra, e, claro, hirsutas oliveiras, às vezes somente espargidas no campo, às vezes modernamente organizadas em fileiras militares prontas para lutar a guerra do azeite, produto cada vez mais valorizado no mundo.

E que, em Portugal, é um bem histórico —como, de resto, em todo o Mediterrâneo, incluindo o nordeste africano onde azeite e vinho cresceram junto com a história do homem.

Visitar as oliveiras portuguesas e seus lagares que espremem as azeitonas e produzem azeite é viajar pela história antiga e recente do país. Pode-se ir a museus e a produções que ainda mantêm métodos milenares, de espremer as azeitonas com moinhos de pedra (o que aos padrões de hoje atenta contra a eficiência e a higiene), ou visitar instalações de uma modernidade high-tech.

E no meio do caminho... conhecer pequenos produtores modernos que realizam um trabalho de artesãos, com produções pequenas em volume e grandes em prestígio. Ou apenas famílias que vivem de produzir os frutos que vão adiante encher as garrafas e latas dos grandes produtores.

Num momento você está na bucólica propriedade de Monte das Louzeiras, com seus azeites e vinhos (fermentados em ânforas de cimento) muito personalizados; logo depois, na Cooperativa de Moura e Barrancos, refletindo seu espanto nas reluzentes e curvas paredes de inox de gigantescos tanques com altura de três andares, de onde jorra o azeite de Moura.

Cai logo depois na moderna butique Quinta do Quetzal, com um restaurante badalado, e desaba em seguida no Clube Galega, uma associação dedicada a manter o prestígio da velha azeitona (a variedade galega) entre os produtores de azeite. Para depois conhecer a milenar Herdade do Esporão e descobrir que, para além da fama dos seus vinhos exemplares, ali também o azeite ocupa um lugar aristocrático.

Tudo isso, claro, tendo que comer nos intervalos alguma açorda, algumas migas, algum porco preto, algum bacalhau, tudo regado por azeite de variedades como galega, cobrançosa, verdeal, cordovil e outras de nomes igualmente estranhos e poéticos --muito portugueses.

DE PASSAGEM

A cozinha do Alentejo tem bons representantes (na região, o mais famoso é o Fialho, em Évora). A nova aquisição para meu caderno de notas é o Taberna Típica Quarta-Feira, dentro da cidade murada. Tocado por pai e filho (aquele na cozinha), tem cozinha típica com deliciosa sofisticação familiar.

O cachaço (corte do pescoço do porco) assado com molho de vinho tinto, ou em outra versão em que é frito com vinagre, vale a viagem. Viagem que pode ser a qualquer dia: como bom português, o restaurante se chama quarta-feira, mas abre a semana inteira.

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