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Antropólogo, autor de "Povo de Deus" (Geração 2020), criador do Observatório Evangélico e sócio da consultoria Nosotros

Por que não usar o termo 'neopentecostal'

No debate público, a categoria quer dizer 'igreja bolsonarista' ou 'fast food religioso', o que é errado

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Pouca gente, exceto sociólogos e antropólogos especializados em religião, conhece o significado de "neopentecostal". Apesar disso, o termo tem aparecido em notícias sobre política e também em debates dentro do campo religioso. Ao usar essa categoria, jornalistas sugerem ter vocabulário sofisticado enquanto confundem e desinformam a sociedade.

Desde a eleição de 2018, "neopentecostal" tem sido usado como sinônimo de "igrejas bolsonaristas". Bolsonaro recebeu apoio de líderes desse grupo, mas, curiosamente, segundo Magali Cunha, pesquisadora do Iser, não havia neopentecostais no primeiro escalão: dois ministros eram pentecostais, Marcelo Álvaro Antônio e Damares Alves, e os demais evangélicos pertenciam a igrejas históricas como a Batista e a Presbiteriana.

Vale lembrar que "neopentecostal" não é uma categoria criada pelos próprios evangélicos. Ela foi proposta pelo sociólogo Ricardo Mariano, da USP, para descrever características presentes em algumas igrejas surgidas no Brasil a partir dos anos 1970. Essas igrejas enfatizam temas como prosperidade e doutrinas de guerra espiritual e ofertam curas e exorcismos, ao mesmo tempo em que rejeitam práticas ascéticas e se afastam do estereótipo do crente "típico" que anda com a Bíblia debaixo do braço.

Mas "neopentecostal" adquiriu uma conotação negativa e pejorativa ao ser usado fora da academia. No campo evangélico, ele se tornou uma categoria acusatória. Segundo o antropólogo Rodrigo Toniol, da UFRJ, é raro um fiel se declarar neopentecostal, mesmo que sua igreja se enquadre nesse grupo. "Normalmente essa é uma categoria de descrição do outro, o que já demonstra a desconfiança que paira sobre ele". A igreja "neo" funcionaria como um "fast-food da religião" que comercializa e vulgariza dons espirituais.

Em círculos progressistas, uma igreja neopentecostal é frequentemente associada a pastores midiáticos, barulhentos e manipuladores e a igrejas com nomes criativos criadas nos últimos 40 anos, que atacam religiões de matriz afro, exploram quem é pobre e usam a religião com fins políticos para impor à sociedade valores conservadores e atacar o estado laico.

O termo neopentecostal é útil na academia, mas não no jornalismo. Ele exclui, por exemplo, as Assembleias de Deus, que somam 12 milhões de fiéis e também atuam amplamente no campo político. Em vez de adotá-lo, é melhor saber distinguir entre igrejas históricas e pentecostais.

E cobrar os cientistas sociais para que apresentem conceitos para a sociedade navegar por esse território novo, importante no âmbito do consumo, da produção cultural e da política.

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