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Espionagem e corrupção caminham de mãos dadas

Entretanto o cidadão tem o direito de não ser vigiado

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O governo Bolsonaro encontrou território fértil para o abuso de poder. Não se trata apenas de desvios de conduta, fruto da visão autocrática do repugnante ex-presidente. Vigora nos meios políticos e administrativos a concepção de que o sigilo é instrumento essencial para a gestão da "inteligência".

A velha e festejada Lei das Licitações (8.666/93), assim como a nova (14.133/21), que entra em vigor em abril, abre mão da disputa e da transparência quando há possibilidade de "comprometimento da segurança nacional". Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) formalizou o princípio, ratificado agora por Jair Bolsonaro: a dispensa da licitação serve para não colocar "em risco objetivos da segurança nacional".

Ninguém sabe dizer o que significa "segurança nacional" e quais seriam os objetivos. Seus fundamentos são herança autoritária do regime militar, cunhado na Guerra Fria, mas a expressão mágica "segurança nacional" ainda protege suborno, desperdício e violação da privacidade.

Sistematicamente, compras e serviços relacionados a inteligência, segurança da informação, segurança cibernética e segurança das comunicações ficam de fora do saudável regime jurídico da moralidade contratual. Isso porque, conforme ensinamento da caquética Escola Superior de Guerra, "segurança" é "sensação de garantia necessária e indispensável a um país", em face de ameaças e vulnerabilidades de qualquer natureza.

Quem procurar notícias antigas sobre licitações e órgãos de inteligência ou investigação verá que o fantasma político da suspeita é recorrente e não tem coloração ideológica.

O orçamento da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) cresceu 44% no primeiro governo Lula (2003-2010). Em 2008, o seu ministro da Defesa, Nelson Jobim, admitia a compra ilegal de maletas de interceptação telefônica.

Charge de Glauco sobre o escândalo de grampos telefônicos no governo Lula - Glauco

Em outra frente do setor da inteligência, agora voltado para a investigação do "crime organizado", outra expressão mágica, que autoriza desvios e abusos, o senador Humberto Costa (PT-PE) enfiou um escandaloso jabuti na medida provisória 656 e alterou a lei da delação premiada. Desde 2015, a Polícia Judiciária (Federal, dos estados e, por extensão, a PM e a Polícia Rodoviária Federal) pode ocultar da população e das agências de fiscalização orçamentária a sua "capacidade investigatória", escondendo contratos para, por exemplo, "captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos e acústicos".

A presidente Dilma Rousseff (2011-2016) não vetou o descaminho legislativo patrocinado pelo correligionário.

O governo de Michel Temer adquiriu o programa israelense que possibilita monitoramento de 10 mil pessoas por ano pela Abin. Segundo O Globo, a empresa fornecedora teria sido representada no país pelo filho do general Santos Cruz, depois ministro da Secretaria de Governo de Jair Bolsonaro.

A gestão do policial Alexandre Ramagem —eleito deputado federal— na Abin consumiu uma pequena fortuna na compra de equipamentos classificados como "sigilosos e reservados". É uma festa. Eles ocultam tudo, até o nome e o CNPJ das empresas contratadas.

O cidadão tem o direto de não ser vigiado. De vez em quando a imprensa revela algum escândalo. O poder público finge que investiga —mas sigilosamente, é claro, pois o que está em jogo é a "segurança nacional" ou a repressão ao "crime organizado". E tudo se repete. Espionagem e corrupção caminham de mãos dadas.

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