Luís Francisco Carvalho Filho

Advogado criminal, é autor de "Newton" e "Nada mais foi dito nem perguntado"

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Descrição de chapéu Folhajus

Rancor democrático

Bolsonaristas querem a anistia dos atos golpistas

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Já tramita no Congresso Nacional projeto de lei propondo o esquecimento dos atos golpistas praticados a partir de 30 de outubro, data do segundo turno. Como o texto prevê a anistia do que pode acontecer até a data em que a lei entrar em vigor, novos atentados seriam alcançados pela iniciativa.

O autor do projeto infame é um dos militares bolsonaristas que poluem a política brasileira, deputado "major" Vitor Hugo. Especializado em fake news, ele também legisla em causa própria.

Ato antidemocrático contra o resultado da eleição presidencial de 2022 em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília - Pedro Ladeira - 15.nov.2022/Folhapress

Segundo a proposta, seriam anistiados "caminhoneiros, empresários e todos os que tenham participado de manifestações nas rodovias nacionais, em frente a unidades militares ou em qualquer lugar". A anistia compreende "crimes políticos ou com estes conexos e eleitorais".

A tal "conexão" foi o estratagema utilizado pela ditadura militar para deixar impunes assassinos e torturadores. O projeto de lei tenta beneficiar, indiretamente, as autoridades civis e militares que prevaricam diante dos movimentos golpistas.

A proposta do deputado "major" prevê a impunidade dos financiadores e organizadores de atos contrários à democracia e dos autores de publicações e comentários fazendo a apologia do golpe na internet.

Até a litigância de má-fé patrocinada pelo candidato Bolsonaro, seu partido e seus advogados no TSE é anistiada pelo projeto de lei.

Há um jogo de xadrez em andamento.

No mesmo dia em que a Polícia Federal prende o empresário Milton Baldin, acusado de convocar caminhoneiros e atiradores para impedir a diplomação de Lula pela Justiça Eleitoral, o projeto de anistia é recebido na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados.

A justificativa do projeto de anistia é, paradoxalmente, proteger "liberdades públicas" —entre elas a de conspirar contra a democracia e o resultado das eleições. O objetivo do deputado "major" é encontrar uma "solução pacificadora" diante de um processo eleitoral "espontaneamente" contestado pelo povo.

Havia no Brasil certa simpatia pela figura do caminhoneiro, como categoria de trabalhadores essencial para o abastecimento das cidades e para a circulação das riquezas.

A série "Carga Pesada", exibida pela TV Globo em dois momentos (1979-1981 e 2003-2007), com personagens simpáticos e ingênuos vivenciados pelos atores Antônio Fagundes e Stênio Garcia, captou este sentimento ou contribuiu para a sua sedimentação.

No cinema norte-americano, porém, o caminhoneiro costuma aparecer como ameaça. Em "Encurralado" (direção de Steven Spielberg, 1971), o assustador caminhão-tanque está nas mãos de um motorista invisível, demoníaco. Em "Thelma & Louise" (direção de Ridley Scott, 1991), o caminhoneiro caipira personifica a perturbação sexual. "Hoffa" (direção de Danny DeVito, 1992) romanceia a trajetória do ex-presidente do sindicato dos motoristas de caminhão dos EUA, suspeito de corrupção e de relações perigosas com gângsteres e crime organizado.

Caminhoneiros indignados com o resultado das eleições de 2022 promoveram atos de terrorismo e violência nas estradas brasileiras, financiados por empresários inescrupulosos, tolerados por policiais e militares e embalados pelo silêncio doentio e criminoso do próprio presidente da República.

A anistia reforça o ideal golpista entranhado na história do Brasil. Diferentemente do que pensa o deputado "major", o momento não é de "solução pacificadora", mas de rancor democrático.

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