Siga a folha

Mestre em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina e doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP.

A política está de mau humor

E isso até seria cômico, se não fosse trágico

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Uma das piores consequências da polarização político-ideológica é a perda do senso de humor. Nem falo de piadas preconceituosas ou de baixo calão. Falo da ironia fina, dos trocadilhos, dessa atividade linguística que torna a vida mais palatável e que também nos faz pensar. Você, caro leitor, já deve ter passado por isto ultimamente: soltou um chiste inofensivo e acabou soterrado por problematizações.

Ilustração publicada no domingo, 13 de fevereiro de 2022 - Ricardo Cammarota

Há séculos filósofos falam sobre o riso. Freud disse que o humor é um mecanismo de economia de energia psíquica: obtemos prazer, em vez de sofrer, em situações ruins. Para Nietzsche e Bataille, o humor possibilita formas de pensamento não ferrenhamente apegadas à razão: já que ela, apenas, é incapaz de lidar com o sofrimento existencial. Daí surgem as comparações entre o humor, a arte e o erotismo.

A poesia é uma erotização da linguagem, já que retira dela sua função meramente utilitária: a comunicação. Da mesma forma, o erotismo arrefece a função utilitária do sexo: a procriação. Estetizar é erotizar, e vice-versa. Os trocadilhos, os duplos sentidos, a ironia, toda essa fricção de palavras e ideias díspares causam ruídos na comunicação, mas produzem novas formas de pensar e de sentir a realidade. Por isso, o humor é uma forma do ser humano se tratar como obra de arte. Ou seja, de escaparmos da objetificação, de nos aceitarmos como falhos, incompletos, e, assim, produzir prazer físico, estético e mental.

Não é à toa, portanto, que a polarização ideológica está minando nossa capacidade de rir e de fazer rir. Cada lado tem políticos de estimação, seres perfeitos, quase deidades. Seus fiéis seguidores viram sacerdotes à caça de pecados não apenas dos inimigos, mas dos próprios pares. Claro que o humor não cabe nisso. Afinal, com ele, ressaltamos nossa condição mais humana e menos divina, percebemos nossas contradições, idiossincrasias, e essa postura é um perigo para quem se vê como detentor da verdade e da bondade.

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas