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Jornalista de ciência e ambiente, autor de “Psiconautas - Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira” (ed. Fósforo)

Crise do clima aumenta risco de novas pandemias virais

Aquecimento muda distribuição de mamíferos e facilita trocas de vírus entre eles

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Mais de dois anos depois de começar a pandemia de Covid, a ciência ainda não conseguiu determinar de que animal surgiu esse coronavírus. É certo, porém, que o aquecimento global aumentará o risco de acontecerem mais dessas trocas virais entre espécies.

Os parentes mais próximos do vírus Sars-CoV-2 foram encontrados em morcegos da China, onde também surgiram os primeiros casos da doença. É provável que uma cepa mutada tenha transbordado de um desses bichos voadores para outro mamífero ou ave e, deste vetor não identificado, para seres humanos.

O salto entre espécies animais está na origem das enfermidades chamadas de zoonoses. Com a mudança do clima em curso, o aumento da temperatura força muitos desses organismos a migrar para áreas mais frias, onde entrarão em contato com membros de espécies que já vivem no local.

Pesquisadores recolhem morcegos na Tailândia para investigar possíveis vírus semelhantes ao coronavírus - Adam Dean - 11.dez.2020/The New York Times

Quando animais se encontram, atacam ou comem uns aos outros, eles trocam vírus, que poderão ou não ser capazes de infectar a nova espécie. Alguns serão, e uma dessas espécies pode ser a humana.

Estima-se que existam 10 mil vírus competentes para invadir células humanas. A maior parte deles ainda aguarda silenciosamente em outros mamíferos a oportunidade de saltar para cima de nós. Em condições normais, isso é raro.

Um trabalho científico publicado online há dez dias na revista Nature estimou a probabilidade de tais encontros perniciosos acontecerem ao longo do próximo meio século, com o agravamento inevitável da crise climática. Não há nada de tranquilizador no estudo.

Pesquisadores dos EUA e da África do Sul criaram modelos de computador alimentados com previsões regionais de aumento da temperatura, distribuição de espécies e possíveis rotas de fuga (em geral para locais mais altos e frescos). Concluíram que 3.139 espécies de mamíferos mudarão de área até o ano 2070.

Os autores estimam que, em meio à movimentação, eventos de transbordamento viral podem duplicar a quantidade e bater em 4.000 nas próximas cinco décadas. Pior: mesmo que consigamos manter o aquecimento da atmosfera abaixo de 2°C, meta nada factível no ritmo atual de descarbonização da economia, os saltos vão acontecer de qualquer jeito.

A dispersão, de todo modo, ocorre lentamente na maior parte das espécies, que encontram barreiras físicas e ecológicas pelo caminho. Mas há um mamífero que consegue ir mais longe e mais rápido —os morcegos, porque voam.

As regiões de maior risco ficam na Ásia e na África, especialmente Índia, Indonésia e o Sahel (região africana ao sul do Saara). Várias condições concorreriam para isso: calor em alta, grande concentração de biodiversidade e seres humanos.

Pode parecer tranquilizador, para brasileiros, que a Amazônia não apareça no levantamento como setor de alto risco, apesar da biodiversidade e do avanço humano sobre a floresta. Pela imensidão, alto endemismo e baixa altitude média, as espécies acossadas pela mudança climática não têm para onde fugir.

No entanto, como a Covid deixou claro, bastam poucos meses para uma pandemia se espalhar pelo globo e chegar aqui. Vírus viajam de avião. E o estrago que fazem ou deixam de fazer depende da qualidade do governo e da vigilância de saúde no território invadido (e todos viram o estrago de Jair Bolsonaro por aqui).

Só resta a prevenção, com vigilância zoonótica e genética, para identificar cedo um transbordamento ou a chegada de novos vírus ao país. O Brasil deveria criar um órgão só para isso, ao estilo dos Centros de Controle de Doenças (CDC) dos EUA, como propuseram Gonzalo Vecina Neto e Pedro Barbosa, na Folha, em 24 de abril.

Sugestão: partir da estrutura da Fiocruz, que já está presente em dez estados e tem competência no ramo, para criar o CDC do B. B de Brasil, do Estado brasileiro, não de Bolsonaro.

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