Professor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA).
A política da culpa: da pandemia às inundações no RS
A polarização afeta a onda de solidariedade e a janela de atenção nos dois eventos
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Desastres naturais afetam a popularidade de governantes: o sentimento negativo gerado contamina sua avaliação como argumentei aqui. Logo após o evento, surge uma onda de solidariedade com as autoridades (no jargão, o rally round the flag), ao que se segue certa fadiga e insatisfação.
Os desastres criam uma janela de atenção sobre quem está no poder que é muito arriscada. O comportamento oportunista em contextos de comoção gera custos e qualquer vacilo ou frase mal-empregada terá efeitos cataclísmicos. Muitos presidentes, ex. George W. Bush após o furacão Katrina, naufragam. Mas há alguns casos de desempenho heroico que alavancam a popularidade.
Lula tem sido pródigo em declarações e ações desastrosas. A nomeação de Paulo Pimenta como Ministro-chefe da Secretaria de Reconstrução do RS sugere hiperpolitização e instrumentalização da tragédia.
A polarização potencializa os efeitos citados que as pesquisas identificaram para tempos normais: ela encurta, mas não elimina a onda de solidariedade. Nos grupos polarizados o viés de confirmação é alto: enxerga-se o desempenho em função das preferências políticas.
O paralelo com a pandemia de Covid-19 é ilustrativo. Vimos a onda de solidariedade na sua primeira fase, mas Bolsonaro foi um dos poucos governantes que não se beneficiou dela por suas declarações estapafúrdias ("é uma gripezinha", "não sou coveiro").
A janela de atenção que se abriu expôs também sua inépcia e a de auxiliares mas permitiu que os custos fossem parcialmente mitigados com a inflação de auxílios oportunistas (Auxílio Brasil, Taxista etc). Assim o saldo da pandemia foi negativo. Sim, os governantes mais eficientes perderam eleições (Piñera, Johnson, Bibi).
As relações federativas foram diferentes. Antes da invenção da vacina, tínhamos 27 pandemias: a responsabilização política estava fragmentada nos estados e municípios.
Nesta fase os governantes do Nordeste e Norte eram culpados (pela corrupção e baixa capacidade institucional) pelo impacto devastador na região, enquanto o Sul ainda não havia sido alcançado. A invenção da vacina (e sua aquisição pelo governo federal) mudou a dinâmica, federalizando a responsabilização.
Na calamidade gaúcha o impacto não se estende a outros estados e a responsabilização permanecerá em maior grau no próprio estado. Os beneficiários estão concentrados no estado. Sim, a magnitude fiscal colossal da tragédia nacionaliza a responsabilização. Os custos serão difusos para o país: de onde virão os recursos? A solidariedade tende a arrefecer paulatinamente. E a tensão entre governador e presidente (e seu interventor local). Provavelmente ambos perderão.
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